sábado, 21 de dezembro de 2024

Paciência

Poema de: Alexandre Paredes 









A paciência é a ciência da paz

É a consciência de que a calma

Não vem de fora, ninguém a traz

Mas ela é cultivada em nossa alma

 

Ninguém pode perder a paciência

Porque quem a tem jamais a perde

E se a perde é porque há insuficiência

De fé para suportar o peso que carregue

 

Como encontrar a calma diante da dor

Sem confiar que ela vem para um bem

Sem saber que ela é nosso maior professor

A nos transformar e a nos levar a mais além?

 

A paciência de verdade somente se conquista

Quando a gente entende e não perde de vista

Que a vida tem momentos de alegria e tristeza

Mas que, em tudo, há luz, verdade e beleza

 

Mesmo os momentos mais amargos

São o prenúncio de dias mais felizes

Que todas as vivências são aprendizados

E as dores de hoje se tornarão cicatrizes

 

Quem vive a paciência sabe que tudo passa

Mas sabe também que é preciso viver o agora

Que o presente é dádiva, bênção, uma graça

E sem vivê-lo plenamente, ele não vai embora

 

A ciência da paz é escolher a paz a cada dia

E saber que ela só vem tendo o bem como guia

É ter ciência de que ela não é a linha de chegada

Mas, sim, como a gente faz a nossa caminhada

 

Viver com paciência é não desperdiçar energia

Com aquilo que não está em nossas mãos mudar

É discernir o que pode ser mudado com sabedoria

Mas, para a sementeira crescer, é preciso esperar

 

Esperar não é o mesmo que não fazer nada

Mas entender que em tudo tem a nossa parte

E tem também aquela parte que não nos cabe

Agindo com esperança sem abandonar a escalada

  

A força da paciência é maior que a força da força

Não força, espera, não revida, perdoa, liberta

Avança no bem, silencia diante do mal que se ouça

Age com amor, luta com fervor, mas sem fazer guerra

 

Você pode perguntar onde deve estar a receita de bolo

Para conquistar a paciência nesse mundo tão atribulado

Ora, busque sempre a paciência todos os dias e o dia todo

Que um dia, após tanto esforço, ela andará ao seu lado

 


sábado, 14 de dezembro de 2024

Ponto de Partida

 Texto de: Alexandre Paredes








Quando você muda sua maneira de sentir e perceber as coisas;

quando você toma consciência de suas crenças limitantes, olha de frente para seus medos e traumas;

quando você descobre seus reais sonhos e as ambições que não são suas, mas que colocaram em você...


Quando você aceita suas fraquezas e descobre a sua força, e se percebe como uma pessoa única, nem melhor, nem pior do que ninguém; quando você pára de se comparar aos outros e só se compara com você mesmo, com o que já foi e com o que quer ser...


Quando você descobre suas máscaras e percebe que pode viver sem elas; quando você se descobre, enfim, e se aceita tal qual é, e não tenta ser alguém para atender às expectativas dos outros; quando você se liberta de uma versão idealizada de si mesmo para abraçar quem você é de fato...


Sua mudança está apenas começando.

Mas não tem mais como voltar atrás.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

Filosofia: Para que Serve?

Texto de: Alexandre Paredes


 







Afinal, para que serve a Filosofia? Qual a sua utilidade prática? Interessante que, para responder a esta pergunta, já estaremos filosofando, isto é, fazendo uma reflexão.

 

Como tenho formação na área, adoro qualquer tipo de reflexão, especialmente aquela que nos leve a ter dúvidas sobre nossas certezas, porque não há avanço no conhecimento, na nossa forma de existir, enquanto permanecermos estagnados na nossa forma de pensar.


Parece uma provocação, mas o fato é que a Filosofia não serve para nada, simplesmente porque não tem uma utilidade prática pré-concebida, um escopo, uma finalidade a serviço de algo ou de alguém.

 

Ela não está a serviço de alguma coisa. Caso contrário, a Filosofia torna-se uma doutrinação, uma catequese, de ideias pré-concebidas, para atender a determinados grupos, determinados fins, sejam políticos, religiosos, econômicos, ideológicos.

 

A Filosofia simplesmente nasce, brota do ser humano, da sua necessidade de viver com reflexão, com sabedoria; da sua busca pela verdade. O que a gente faz com essa reflexão vem depois. A utilidade vem depois. A própria questão da utilidade das coisas já é uma reflexão filosófica.

 

Por exemplo, qual a utilidade de uma pessoa? Ela só tem valor se for útil? E o que pensar da existência de uma pessoa que vive num leito de um hospital com uma doença incapacitante? Essa vida só tem valor se tem utilidade?

 

O mesmo raciocínio pode-se aplicar a uma pessoa que foi útil durante toda a sua vida, mas ao chegar na velhice, adquire uma demência ou doença que a torne incapacitada de realizar as atividades mais básicas. Essa pessoa não tem mais valor? Claro que tem. Porque o valor da existência de uma pessoa e o valor de um ser humano não pode ser medido pela régua de sua utilidade.

 

Mas isso sou apenas eu filosofando, porque há correntes de pensamento que medem o valor das coisas pela sua utilidade. Então, não existe “uma” Filosofia. Ela é múltipla, tanto quanto são múltiplas as formas de interpretar o mundo, a vida, a realidade, a verdade.

 

Não se pode dizer, por exemplo, “O que a Filosofia diz sobre determinada coisa, sobre determinado assunto”, pois existem várias correntes de pensamento dentro da tradição filosófica, em que há convergências, divergências e linhas paralelas sobre os mais diversos temas.

 

Então, a Filosofia é um eterno diálogo com os filósofos que nos antecederam, um eterno diálogo com os mortos. Até hoje, dialogamos com Platão, Aristóteles, Agostinho, Descartes, Kant, entre tantos outros, todos eles pensadores que viveram há alguns ou muitos séculos antes de nós.

 

A gente não “acata” nem “adota”, simplesmente, “uma” Filosofia; a gente debate, questiona, corrobora ou rejeita determinadas ideias com argumentos racionais. Mas escuta também, estuda também. Porque, no mundo de hoje, as pessoas só querem é opinar, sobre tudo, sobre todos, emitir parecer sobre o que não estudaram, não se aprofundaram, não refletiram. Isto não é Filosofia, não é reflexão, é apenas opinião, ou “doxa” como os gregos antigos a chamavam.

 

A gente até pode, e até consegue, filosofar sem ter tido contato com nenhum pensador da tradição filosófica, mas corremos o risco de pensar o que já foi pensado e já foi debatido e discutido muito antes de nós nascermos. Seria algo parecido como chegar no final de uma reunião e querer debater um assunto que já foi exaustivamente discutido, e ainda ter a pretensão de estar sendo original.

 

Podemos comparar a Filosofia à arte. Ninguém amanheceu num determinado dia e disse “a arte terá esta ou aquela finalidade”. A arte simplesmente nasce de uma necessidade do ser humano de se expressar subjetivamente, pois sua existência não pode ser definida apenas pelos parâmetros objetivos da razão.

 

Assim, fazemos arte para aliviar nossas dores, expressar nossa alegria, tristeza ou indignação, para compartilhar a beleza, o prazer, para buscar sentido na vida, nas nossas angústias, para encantar, para reunir, para se relacionar com o sagrado. Poderíamos elencar uma lista sem fim de motivos pelos quais fazemos arte, mas não há uma finalidade pré-definida ou pré-concebida para ela, pois qualquer delimitação seria um reducionismo e um aprisionamento do seu voo.

 

Há pessoas que ganham muito dinheiro com a arte, sejam as artes plásticas, a música, o cinema, o teatro. Existem grandes indústrias que se beneficiam da arte. Mas reduzir a arte ao seu valor econômico, ao ganho financeiro, é uma forma muito estreita de enxergá-la. A arte resgata vidas, produz reflexão, mudanças sociais e nos costumes, produz sonhos e enriquece a existência.

 

Se a Filosofia “não tem uma utilidade”, então alguns podem pensar que seria melhor eliminá-las das escolas, das faculdades, já que, como alguns creem, ela seria apenas um objeto de estudo para desocupados. É um grande engano, gerado por mentes não acostumadas à reflexão ou que se sentem ameaçadas por ela.

 

Ocorre que, embora a Filosofia não tenha “uma” finalidade específica, o resultado que ela produz na vida do ser humano é inestimável. A Ciência como a conhecemos hoje e, na verdade todas as ciências, nasceram da Filosofia. A Filosofia surgiu na Grécia Antiga como uma forma de pensar fora do quadrado da Mitologia Grega, quando todas as explicações dos fenômenos observados se vinculavam à vontade dos deuses.

 

Em seu início, a Filosofia buscava compreender a origem das coisas, a natureza intrínseca de tudo o que existe, as substâncias primordiais que seriam os blocos de construção da nossa realidade, a essência do Cosmos em suma, sem que, para isso, fosse necessário dar explicações mitológicas.

 

Depois, com Sócrates e Platão, o foco da Filosofia foi deslocado para o conhecimento do próprio homem, porque entendia-se que o homem não tinha meios de conhecer o Cosmos, mas tinha meios de conhecer a si mesmo, de entender o que seria uma vida boa, plena, o que seria o justo, o bem, o belo, o certo o errado, qual seria o sentido da vida e como lidar com os sofrimentos e adversidades. Surgia a Ética, que é a reflexão sobre a Moral.

 

Mesmo assim, a Filosofia nunca teve somente um foco específico. Seus objetos de estudo mais comuns foram ou ainda são: o Conhecimento, a Ética, a Lógica, a Justiça, a natureza do Ser, a Política, a Educação, a Religião, a Ciência, a Verdade, a Causalidade, a Estética, a Razão, a Normalidade e a Loucura, a Felicidade, enfim, uma lista sem fim.

 

Sem a Filosofia, não haveria questionamento a respeito das verdades religiosas impostas como dogmas. Sem reflexão, estaríamos, quem sabe, ainda imaginando que a Terra seria plana e que seria o centro do Universo. Sem Filosofia, não haveria a busca pelo conhecimento nem as bases da educação institucionalizada como a vemos hoje. Teríamos, talvez, apenas uma educação totalmente voltada para inculcar nas mentes os dogmas das igrejas mais poderosas politicamente ou voltada para atender aos objetivos, na maioria das vezes escusos, dos nossos governantes.

 

Sem Filosofia, não haveria questionamentos a respeito da forma de governar daqueles que detém o poder, nem seria possível pensar a sociedade como criação humana, que pode e deve ser aprimorada. Não conheceríamos a Democracia como a concebemos hoje, com os seus três poderes e seus sistemas de pesos e contrapesos para que os governantes não tenham poder demais em suas mãos para governarem visando atender aos próprios interesses, em vez de atender aos interesses do povo.

 

Com a Filosofia, continuamos a fazer aqueles questionamentos básicos sobre a nossa existência: O que somos? Temos uma essência? Existe um objetivo para a nossa existência? Qual o sentido da vida? O que é uma vida plena e feliz? De onde viemos e para onde vamos? Embora as religiões, e até mesmo a Ciência, busquem dar essas respostas, o fato é que a nossa razão nunca deixa de fazê-las, e não se satisfaz em apenas terceirizar essa reflexão para algo ou alguém externo a nós, um guru ou uma instituição que supostamente teria todas as respostas.

 

Quando Sócrates foi condenado a beber cicuta, sob a acusação de que estava supostamente pervertendo a mocidade, apenas porque estava levando as pessoas a questionarem suas próprias certezas, a questionarem as ideias que os levavam a acreditar saber o que não sabiam, alguns amigos lhe deram a opção de permitir sua fuga da condenação. Sócrates preferiu beber o veneno “a viver uma vida sem reflexão”.

 

Vejo esse exemplo de Sócrates como um dos mais inspiradores da humanidade. Enquanto, muitas vezes, estamos debatendo sobre a utilidade da Filosofia ou sobre a necessidade de seu estudo nas escolas, se ela traz algum retorno econômico para o País, se ela pode gerar empregos, riquezas, valor econômico, se ela faz alguma diferença em nossas vidas, Sócrates não via sentido em viver uma vida sem reflexão.

 

Creio que muitas coisas que ainda hoje fazemos não fariam sentido, ou seriam feitas de forma diferente, se tivéssemos um pouquinho de reflexão. As guerras, o fanatismo político ou religioso, a vida irreal e virtual das redes sociais, a violência social gerada pelo abismo entre pobres e ricos, o consumismo desenfreado, a destruição do planeta, a poluição de rios e mares, o aquecimento global por conta da ação humana, o alto investimento em armas e o baixo investimento em educação e saneamento, os governos autoritários, a opressão de determinados grupos devido à sua cor da pele ou ao seu sexo, entre outros, são apenas alguns aspectos da nossa realidade que teriam, certamente, um tratamento diferente se cada ser humano do planeta vivesse como Sócrates, uma vida de reflexão.

 

Fica a reflexão. Para que serve a Filosofia? Talvez, a melhor resposta seja, ao modo filosófico, na forma de uma pergunta: Para que serve a vida mesmo?


quarta-feira, 10 de julho de 2024

Alertas

Texto de: Alexandre Paredes



 







Que a tua paz não seja a paz da omissão perante a injustiça e a violência que ocorrem ao teu redor.

 

Que o teu sossego não seja o da indiferença perante o desassossego de muitos que vivem sem saber se terão o que comer amanhã.

 

Que a tua luta contra a opressão não signifique oprimir os opressores nem oprimir aqueles que são mais fracos do que tu ou que não tenham voz na sociedade.

 

Que a busca por difusão da tua fé não redunde em intolerância e falta de respeito para com aqueles que descreem ou creem de modo diferente do teu.

 

Que o teu modo de pensar não se transforme numa presunção da posse da verdade, para que não te tornes vítima do fanatismo nem sejas um espinho humano.

 

Que o teu amor à Pátria não se transforme em egoísmo de Pátria nem em desamor àqueles que não comungam com os teus ideais de Pátria.

 

Que a tua doçura não se transforme em veneno ao falar por trás o que não consegues falar face a face, visto que a fofoca é a arma do fraco.

 

Que o teu amor não se transforme em prisão para aqueles que são os objetos de tuas mais valiosas afeições.

 

Que o teu pranto não seja o da ingratidão perante todas as dádivas que a vida tem te concedido, tampouco o da falta de confiança nos desígnios de Deus.

 

Que a tua dor não seja a dor de ontem nem a dor de amanhã, pois, a cada dia, basta o seu mal, e cada alvorecer nos reserva sempre um novo presente.

 

Que a tua bondade não se transforme em brasa fervente que queima a mão do beneficiado com a humilhação que venha acompanhada do teu ato.


Que a tua vida não seja um tributo a coisas mortas ou perecíveis, como dinheiro, bens materiais, beleza, fama, luxo, e que o teu valor seja medido pelo valor que dás às pessoas e às coisas mais pequeninas.

 


sábado, 6 de julho de 2024

Vida Extraterrestre



 Artigo de: Alexandre Paredes









Não faz muito tempo – e ainda nos dias atuais – pensava-se que a Terra era plana e que ela seria o centro do Universo. O homem seria um ser especial na Criação de Deus, enquanto os animais e vegetais teriam a função de servir ao homem. Muitos seres humanos foram queimados nas fogueiras da Inquisição por colocarem esse sistema de crenças em xeque.

 

Hoje sabemos que nosso planeta é um grão de poeira no Universo e que nossa estrela, o Sol, é só mais uma entre infinitas estrelas distribuídas num espaço inimaginável para nossa inteligência. Se contássemos todos os grãos de areia que existem no nosso planeta, tanto nas praias quanto nos desertos, ainda assim, seria um número insignificante diante do número de estrelas que são estimadas em nosso Universo.

 

Mas vamos adiante. Imagine que dentro do nosso Sol caberiam cerca de 1 milhão e 300 mil Terras! Dentro do nosso Sistema Solar, a Terra não é sequer um dos maiores planetas. Bem maiores que a Terra, temos Júpiter, Saturno, Urano e Netuno.

 

É difícil conceber um corpo celeste tão imenso assim como o nosso Sol. Mas existem estrelas que são tão grandes que caberiam milhões de estrelas como o nosso Sol dentro dela.

 

A luz é o que temos, em tese, de mais veloz na natureza. Ela é tão rápida que dá cerca de 8 voltas na nossa Terra em 1 segundo. Mesmo com essa velocidade toda, a luz viaja do Sol à Terra em cerca de 8 minutos. Essa mesma luz, partindo da Terra hoje, chegaria à estrela mais próxima, vizinha do Sol, em cerca de 4 anos.

 

Estamos falando de estrelas vizinhas, “próximas”. Agora, imagine que nossa Galáxia, a Via Láctea, contém cerca de 300 bilhões de estrelas, contendo ao seu redor, seus sistemas de planetas, luas e sabe lá o que mais!

 

Nossos telescópios não conseguem ver os planetas de outros sistemas estelares, porque são opacos e muito pequenos. É como procurar um vaga-lume que está a uns 6 km de distância em plena luz do dia. O Sol brilha demais e ofuscaria a luz do vaga-lume. Então, foi preciso estabelecer um método engenhoso para descobrir planetas fora do Sistema Solar. Um método utilizado foi esperar que o planeta passe na frente da estrela observada. Sua luz diminui um pouco, bem pouco mesmo, sinal de que há o trânsito de um objeto, um planeta. Com isso, já foram descobertos centenas de planetas fora de nosso Sistema Solar.

 

Mas voltemos à Via Láctea, nossa Galáxia. Poderíamos chamar a Via Láctea de nosso bairro e o Sistema Solar de nossa rua. Só que esse bairro tem esse número gigantesco de ruas. Cada rua, ou cada sistema estelar, provavelmente tem seus planetas, luas, cometas, asteroides. A mesma luz que levou 4 anos para chegar à nossa estrela mais próxima, além do Sol, leva 100 mil anos viajando de uma ponta à outra da nossa Galáxia!

 

Nossa Galáxia tem o formato de um disco, uma espiral com vários braços. Cada braço dessa espiral contém bilhões de estrelas e, no meio da Galáxia, há um imenso buraco negro, com cerca de 4 milhões e 300 mil massas solares.

 

Imagine se fizéssemos uma maquete, em escala, da Via Láctea. Nessa maquete, o Sol teria o tamanho de um glóbulo vermelho, que é uma célula de sangue. Essa bolinha microscópica, que teria um tamanho de 17 vezes menor que a espessura de um fio de cabelo, seria o nosso Sol. Ao redor dele, teriam os planetas que conhecemos. Nessa maquete, o Sistema Solar teria o tamanho de uma moedinha de 25 centavos, e a Via Láctea iria do norte da América do Norte ao sul da América do Sul. E todo esse espaço estaria pontilhado de sistemas estelares, alguns do tamanho dessa moedinha, outros muito maiores.

 

Agora, imagine que a nossa Galáxia, a Via Láctea, é tão somente uma entre bilhões de galáxias. Os cientistas estimam que existam, pelo menos, cerca de 2 trilhões de galáxias! E cada galáxia contendo suas bilhões de estrelas e seus trilhões de mundos. A nossa galáxia vizinha, a mais próxima, chama-se Andrômeda, e contém cerca de 1 trilhão de estrelas. A luz que partiu dela levou 2,5 milhões de anos viajando no espaço para chegar aos nossos telescópios. Ou seja, quando essa luz começou sua viagem em direção aos nossos olhos, o ser humano ainda não existia aqui na Terra. Havia apenas os nossos ancestrais primatas mais remotos, que mais pareciam com os macacos.

 

As galáxias mais distantes já observadas estão a cerca de 13 bilhões de anos-luz, ou seja, a luz delas viajou esse tempo inimaginável para chegar aqui. Significa que o que estamos vendo quando apontamos nossos telescópios para elas é o passado, um momento em que o Universo ainda era bem jovem. Estamos vendo aquela determinada galáxia como era 13 bilhões de anos atrás.

 

Agora, imagine que dentre esses sextilhões e sextilhões de estrelas e mundos que existem no Universo, o único que teria a primazia da vida e da vida inteligente seria este nosso planetinha azul que chamamos de Terra, e que gira em torno de uma pequena estrela que chamamos de Sol!

 

Se acreditamos em Deus, seria um grande desperdício de tempo, de espaço e de trabalho na Criação simplesmente para nada. Ninguém nem nada habitaria esses tantos lugares. Estaríamos, assim, duvidando de um dos atributos mais básicos que esperamos da Inteligência Suprema do Universo, que seria sua infinita sabedoria. Esperaríamos que Deus tivesse criado tudo com algum propósito. E que propósito haveria para trilhões de corpos celestes destinados a coisa nenhuma?

 

Se não acreditamos em Deus, teremos que, no mínimo, aceitar que a existência da vida na Terra e, ainda mais, a vida inteligente, teria sido resultado de tantas coincidências improváveis, tão improváveis quanto a mesma pessoa ganhar na Mega-Sena da Virada milhares de vezes seguidas. Tanta improbabilidade estatística só nos leva a concluir que o acaso não pode ter sido a causa de tanta complexidade, que é a existência da vida e da vida inteligente.

 

Só mesmo o orgulho do ser humano o mantém cego diante da realidade de que não estamos sozinhos no Universo. Porque se aconteceu aqui a vida, não há nenhuma improbabilidade lógica de que ela tenha germinado e se desenvolvido em outros mundos. E do mesmo modo que a vida evoluiu para a vida inteligente aqui, é muito provável que civilizações complexas e tecnológicas existam aos milhões pelo Universo afora.

 

Alguns cientistas admitem que é mais provável que haja vida em outros mundos, mas que não seria possível que seres alienígenas nos visitem, dadas as imensas distâncias que separam os sistemas estelares uns dos outros. O problema desse discurso é pressupor que, hoje, detemos todos os conhecimentos sobre as leis da física e as virtuais tecnologias para transpor esses grandes espaços. Mais uma prova da arrogância humana.

 

Nossa Ciência é muito recente na história humana. Nossa civilização alcançou algum nível tecnológico também há muito pouco tempo. Basta lembrar que há somente 500 anos conseguimos transpor os oceanos com nossas caravelas. Levávamos muitos meses para atravessar o Oceano Atlântico para chegar ao continente Americano. Então, dá para imaginar que, com o avanço da tecnologia e do conhecimento das leis da física nos próximos milhares de anos, talvez seja possível visitarmos mundos absurdamente distantes para os padrões de hoje.

 

Se imaginarmos que, em outros mundos, civilizações tenham se desenvolvido e evoluído há milhares ou milhões de anos, não é difícil de imaginar que seres de outros mundos tenham encontrado tecnologias que lhes permitiram viajar até aqui.

 

Quando vemos tantos relatos de avistamentos de OVNIS, contatos com seres que surgem de naves que descem do céu, abduções, a tentativa de classificar esses relatos como absurdos ou sem explicação soa mais como negação de uma realidade óbvia: a de que estamos sendo visitados por seres extraterrestres inteligentes e evoluídos tecnologicamente.

 

A dificuldade de aceitar essa realidade tem origem muito mais nos sistemas de crenças religiosos da maioria das pessoas ou do incorrigível orgulho do ser humano, que tem dificuldade em aceitar que há seres muito acima dele.

 

A Ciência também encontra grande dificuldade em imaginar vida em outros mundos que seja diferente da vida que evoluiu em nosso mundo, baseada em água, carbono e oxigênio. Creio que somente com o avanço dos nossos conhecimentos e da nossa Ciência é que poderemos aceitar outras formas de evolução da vida.

 

Há pouco tempo imaginávamos ser impossível haver seres vivos que habitassem as regiões abissais dos nossos oceanos, até que essas regiões foram visitadas por submarinos que suportassem altas pressões. Estávamos enganados. Há centenas de espécies vivendo nessas regiões, seres que parecem até alienígenas.

 

Acredito que, em breve, constataremos que estávamos enganados, também, com relação à possibilidade de a vida se desenvolver em mundos totalmente diferentes dos nossos. É só uma questão de tempo.

 


sexta-feira, 10 de maio de 2024

Liberdade

Artigo de: Alexandre Paredes 









A liberdade geralmente é imaginada como uma condição em que podemos fazer o que quisermos. Mas a gente sabe que não é assim que as coisas funcionam. Como já dizia minha avó, “quem só faz o que quer, recebe o que não quer”, ou “quem fala o que quer, escuta o que não quer”.  Ou seja, a liberdade total, sem limites, é uma ilusão, não existe, pois sempre estaremos limitados pelo direito de outrem.

 

O homem poderia considerar-se livre para fazer o que quiser somente se vivesse completamente só, isolado do mundo. Mas o ser humano tem necessidade de viver em sociedade, seja por necessidade de afeto, necessidade da proteção do outro, dos serviços dos outros. Aquilo que me falta, em inteligência, em capacidades, em habilidades, sobra no outro. Nós, seres humanos, somos dependentes de outros seres humanos.

 

Então, não há como fugir das relações com outras pessoas e, por conseguinte, da limitação que a vida em sociedade nos impõe; não há como desconsiderar as necessidades e direitos das outras pessoas. E ainda que eu vivesse completamente sozinho, o mundo material e a força das circunstâncias impõem suas exigências, que, por sua vez, cerceiam minha liberdade.

 

Podemos dizer que nossa liberdade está, basicamente, sujeita a quatro variáveis: o que eu quero, o que eu posso, o que eu devo e o que eu necessito. Nem tudo que eu quero, eu posso; nem tudo que eu posso, eu quero; nem tudo que quero e posso, eu devo; nem tudo o que eu devo, posso ou quero; há coisas que quero, mas não necessito, e há ainda coisas de que necessito, mas não quero ou evito. Há ainda uma quinta variável, que são os condicionamentos do meio, seja o meio social ou as condições físicas, como já mencionado e que falaremos mais adiante.

 

QUERER E PODER.

 

Quero voar, por exemplo, mas não posso, simplesmente porque meu corpo me impõe o limite e me incapacita de voar. Mas o ser humano tem a liberdade de criar equipamentos, com sua inventividade, usar recursos financeiros e técnicas para voar, seja de parapente, asa delta ou avião. Não é a mesma coisa que voar como um pássaro, mas podemos exercitar nossa liberdade para buscar essa aproximação com a liberdade total de voar.

 

Uma pessoa que, por uma doença qualquer ou em razão de algum acidente, esteja restrita a uma cadeira de rodas ou a um leito, pode querer muito se levantar e andar, locomover-se, ter autonomia, mas não o pode, uma vez que seu corpo não lhe permite.

 

Assim, os adeptos de ideias como “querer é poder”, de forma literal, iludem-se e iludem aqueles que os ouvem. Nesse momento da nossa sociedade, em que há uma profusão e proliferação de escritores e oradores de autoajuda, é muito comum observarmos esse tipo de ideia sendo difundida e reproduzida sem muita reflexão. Com alguma alteração aqui, outra ali, a ideia de fundo, seja para fins motivacionais, terapêuticos, ou apenas para o lucro mesmo dos autores de livros ou palestrantes de autoajuda, é a de que tudo depende só da nossa vontade; que, se tivermos vontade firme, sim, nós podemos.

 

E quando o leitor incauto ou o ouvinte dessas ideias não consegue obter aquilo que almejava, a justificativa dada pelo autor de obras de autoajuda é muito simples: dizer ao leitor ou ouvinte que, se ele não conseguiu, se ele não alcançou o que queria, é porque faltou-lhe vontade firme, faltou-lhe fé ou é porque sua mente está sintonizada com a falta, com a carência, com o insucesso, o fracasso.

 

Assim, quem dita as receitas de bolo de autoajuda continua bem na fita, pois a culpa de não ter dado certo é sempre daquele que não acreditou o suficiente, daquele que não seguiu a “receita” corretamente.

 

Ocorre que a experiência nos tem demonstrado que nem tudo que eu quero eu posso. Não se trata de desqualificar ou ignorar as palavras de Jesus quando disse que “a fé transporta montanhas”. Não duvido do poder da fé, nem duvido da força da vontade interior, mas não podemos ignorar que, para se construir um prédio, são necessários engenheiros, centenas de trabalhadores, equipamentos pesados, muito concreto, aço e muito trabalho. Sem recursos e sem mão de obra, o prédio não se fará por si mesmo, apenas por ato do nosso querer.

 

É importante lembrar também das palavras de Tiago, o apóstolo, quando disse que “a fé sem obras é morta”. Ou seja, a fé pode transportar montanhas, mas é preciso mobilizar nossas forças, colocá-las em ação, para que nossa fé não se restrinja a palavras vãs.

 

Quando Jesus disse que “com a fé, nada nos seria impossível”, creio que muitas coisas que acreditamos ser impossíveis podem ser realizadas se tivermos fé, mas levar essas palavras ao pé da letra não é muito diferente de querer “arrancar um olho se ele for motivo de escândalo”, conforme também palavras de Jesus, mas que certamente não devem ser compreendidas em sentido literal. É necessário discernir aquilo que está em nossas mãos, aquilo que está na nossa governabilidade, daquilo que não está.

 

Nesse aspecto, gosto muito da Oração da Sabedoria, atribuída a São Francisco de Assis: “Senhor, dai-me força para mudar o que pode ser mudado, resignação para aceitar o que não pode ser mudado, e sabedoria para distinguir uma coisa da outra”. Penso que é um ato de fé, também, resignar-se diante de algo que não pode ser mudado, aceitar os desígnios de Deus para nossa vida quando, pelo discernimento, percebermos que se trata de algo que não está em nossas mãos mudar.

 

Quando o Titanic começou a afundar, imagino que os passageiros e a tripulação queriam, com todas as suas forças, que o navio não naufragasse nas águas gélidas do Atlântico Norte. Mas, naquele momento, com o casco completamente avariado, após ter sido rasgado por um iceberg, não haveria nenhuma força de querer, nenhuma força de pensamento que pudesse ser capaz de evitar a tragédia e impedir que o transatlântico fosse para o fundo do oceano.

 

O maior problema dessas receitas de autoajuda é pressupor que aquilo que funcionou comigo ou funcionou com algumas pessoas funcionará com todas as pessoas. Cada pessoa é única. Uma pessoa pode não ter limitações físicas, neurológicas, mas pode ter limitações psicológicas, traumas que sequer conseguimos imaginar, porque não fomos nós quem os vivenciamos.

 

Então, dizer para alguém, simplesmente, que se ele quer ele consegue é, no mínimo, uma forma de eu não me aprofundar no drama que essa pessoa viveu ou está vivenciando, uma forma de me afastar da dor do outro, de não ter empatia pelo outro. E quando aplicamos essas fórmulas rasas em nossa vida, também não deixa de ser um modo de não entrar em contato com a raiz de nossos problemas, que precisam ser conhecidos, compreendidos, para serem enfrentados.

 

Podemos, então, dizer que o “querer” é uma força poderosa, e é nisso que está a sabedoria do provérbio “querer é poder”, mas não no sentido de que tudo o que quisermos nós poderemos obter, e que, se não conseguimos algo, é porque nos teria faltado a força de vontade.

 

QUERER, PODER E DEVER.

 

Se eu passar por um banco e encontrá-lo com as portas abertas, sem guardas de segurança, o cofre aberto, sem câmeras de segurança e o dinheiro estiver ao alcance das minhas mãos, eu posso querer pegar o dinheiro, eu posso ter condições de pegar o dinheiro, porque está fácil de pegá-lo, mas não devo, porque o dinheiro não é meu.

 

Mesmo que ninguém veja, eu estou vendo o que estou fazendo. Ainda que seja garantido que a polícia não irá me pegar, eu não me sentirei em paz em me beneficiar com um dinheiro que não é meu.

 

A gente costuma imaginar que a privação da liberdade só acontece quando somos constrangidos pela justiça dos homens. Mas, na verdade, existe uma privação da nossa liberdade quando cometemos algum ato que sabemos não ser correto, não ser devido: a liberdade da nossa consciência tranquila, a liberdade da mente.

 

Há quem não se sinta nem um pouco incomodado, é verdade, em causar dano a outrem, mas não acredito que essa inconsciência dure para sempre. Em algum momento, seja nesta vida ou na vida futura, essa pessoa que causou algum dano perceberá seu erro e sentirá a dor na consciência, que é a pior privação da liberdade.

 

Se existe algum lugar ou alguma dimensão do ser humano em que ele possa dispor de liberdade total, seria a sua própria mente ou sua própria alma. E, certamente, aquele que não está em paz com sua consciência será escravo da necessidade de reparação até que ela aconteça de fato.

 

Para muitos – e é bem compreensível – o dever parece uma limitação, uma prisão ou algo que nos escraviza. Mas podemos enxergar o dever de outro modo, não como as grades da prisão, mas, sim, como a chave dessa prisão, que nos permite entrar e sair quando quisermos. Aquele que cumpre seu dever tem sua consciência livre e fortalecida, assim como não se deixa dominar pelo jugo das paixões.

 

À primeira vista, a liberdade parece ser exatamente a possibilidade de satisfazermos os nossos desejos e paixões, mas uma reflexão mais acurada nos faz perceber que a satisfação desenfreada das paixões é mais escravidão que liberdade.

 

Citemos o caso de pessoas que se entregam a vícios de qualquer natureza, como drogas, por exemplo. No início, a droga traz uma sensação de prazer efêmera e intensa. Para obter essa mesma sensação, o usuário precisa de quantidades cada vez maiores da droga, pois o organismo se acostuma com aquela substância. Em pouco tempo, a pessoa torna-se escrava da droga. Tudo em sua vida gira em torno do uso daquele entorpecente.

 

Não é muito diferente o caso das pessoas que se acostumam com o cigarro, o álcool e até mesmo com relacionamentos abusivos. Há pessoas que não conseguem sentir prazer, se divertir, se não tiveram um copo de bebida alcoólica ou um cigarro na mão, da mesma forma como há pessoas que não conseguem viver sem a presença da pessoa com quem se relaciona, ainda que essa pessoa lhe infrinja humilhações, agressões e sofrimentos de todo tipo. Nesse aspecto, o prazer que buscamos torna-se mais escravidão que liberdade.

 

A prática do dever nos fortalece perante a sedução das paixões escravizantes. Eu posso até querer fazer algo, mas quando não devo, não faço. Então, há uma força dentro de mim que se sobrepõe à força que queira me levar a fazer o que não seja bom, não seja útil ou devido para mim.

 

Como dizia Paulo de Tarso: “Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém”. Ou seja, eu até posso fazer o que é ilegal, ou o que é considerado imoral, ou o que não seja ético, ou o que não seja bom para a minha saúde, mas isso terá consequências boas para mim? Essa é a pergunta que sempre devemos fazer no exercício da nossa liberdade.

 

Mas qual o limite do dever? Onde ele começa e onde termina? Essa resposta ninguém a tem, pois não existe um gabarito disponível sobre isso em algum lugar. O exercício de procurar saber qual é o nosso dever é uma consulta diária à nossa consciência. Porém, é necessário ter o cuidado para discernir aquilo que é, de fato, o que minha consciência fala daquilo que a sociedade me impõe como dever, daquilo que as religiões instituídas por seres humanos falíveis me impõem como dever e daquilo que meus pais me ensinaram como dever.

 

Daí nascem grandes dificuldades para o exercício do nosso livre arbítrio, que é a nossa capacidade de escolher e decidir o que é bom e o que não é bom, o que é justo e o que não é justo, o que é correto e o que é errado, para então exercermos nossa liberdade de seguir um caminho em vez de outro.

 

Em nossa caminhada, nos deparamos com a Igreja que nos estabelece o dever de frequentarmos semanalmente o culto religioso, para poder estar com Deus, ou então, o de pagarmos o dízimo para que estejamos quites com a religião; é comum muitos pais exigirem dos filhos deveres excessivos para com eles, sob pena de os filhos serem tidos por ingratos; há o dever imposto pela Pátria de assassinar pessoas desconhecidas de outros países, para atender, não raro, a interesses escusos de governantes que só querem mais poder.

 

Se fizermos um exame de consciência profunda, podemos chegar à conclusão de que muitos desses deveres não o são de fato; são deveres que o meio social quer nos impor, mas que estão distantes do dever que nossa consciência entende por dever. E a consciência sempre terá a liberdade de perceber o dever de forma diferente do que a sociedade nos impõe.

 

Se assim não o fosse, leis humanas nunca seriam mudadas, nunca haveria revoltas de determinados grupos sociais. As leis evoluem, modificam-se, justamente porque a percepção do que é justo e injusto, certo e errado, vai mudando com a evolução da sociedade. E a sociedade somente evolui porque sempre há a possibilidade de cada pessoa optar por pensar e agir diferentemente do que a sociedade estabeleceu como regra, norma ou dever.

 

NECESSIDADE.

 

Enquanto estamos imersos num corpo material, somos acometidos pela necessidade o tempo todo. Temos necessidade do oxigênio, de água, de alimento; temos necessidade de nos proteger do frio, do calor e da chuva; precisamos de abrigo contra as intempéries da natureza; precisamos atender às nossas necessidades fisiológicas; temos necessidade de repouso; temos necessidades sexuais, bem como necessidade de afeto.

 

Há pessoas que usam sua própria vontade, usam sua liberdade para evitar aquilo que podemos considerar como necessidades. Por exemplo, há quem realize longos jejuns, evitando o alimento, com vistas a alcançar um estado mental de maior liberdade perante o jugo que a matéria exerce sobre nossa mente. Há quem escolha o celibato como uma forma de alcançar algum tipo de contrapartida, seja espiritual, seja visando uma maior liberdade espiritual. Temos essa liberdade de buscar impor nossa vontade sobre nossas necessidades, mas há sempre um grande esforço para isso, há um preço a pagar.

 

Deixar de se alimentar, privar-se do sono, do sexo, do prazer, expor-se ao frio por um motivo qualquer, sempre é possível quando se tem uma vontade firme, mas a necessidade sempre está ali, rondando nossa mente. Quando a necessidade não é satisfeita, não deixa de existir uma espécie de escravidão mental em relação àquilo de que a pessoa está sendo privada. É muito comum, por exemplo, em reality shows de programas de TV relacionados a testes de sobrevivência, as pessoas que se encontram nessa situação somente falarem sobre uma boa comida, água pura, um bom banho, ou seja, sobre tudo o que lhes falta naquele momento.

 

Essa constatação nos leva a concluir que aquilo que mais falamos ou pensamos o tempo todo é o que mais sentimos falta. O que sentimos mais necessidade não deixa de ser, desse modo, uma forma de escravidão mental, uma privação da liberdade. A necessidade impõe, assim, limite à minha liberdade. Preciso satisfazer à minha necessidade ou, no caso de alguns, preciso me esforçar, me disciplinar, para me sobrepor à força coercitiva da necessidade, de modo a me libertar um pouco do seu jugo.

 

Algumas necessidades eu consigo postergar, suportar ou até suprimir, mas sempre pagando um determinado preço. Pessoas conseguem ficar sem respirar por 6 a 7 minutos, ou até muito mais; sem água por 3 a 5 dias; é possível ficar sem alimento por algumas semanas. Mas quanto tempo podemos ficar sem amor, sem prazer, sem carinho, sem afeto?

 

Há pessoas que passam uma vida sem terem essas necessidades satisfeitas, porém isso afeta profundamente sua liberdade. Da mesma forma como alguém que suprime sua respiração fica escravo mentalmente da necessidade de respirar; do mesmo modo que alguém que não bebe água há 3 dias fica aprisionado à necessidade de se hidratar, a pessoa que não tem suas necessidades psicológicas atendidas vê-se escravo dessas necessidades, ou seja, sua liberdade está sendo cerceada pela necessidade.

 

Muitos conseguem sublimar essas necessidades psicológicas, direcionando sua energia para coisas saudáveis. Por exemplo, há quem não tenha recebido amor, afeto dos pais na infância e sublime essa carência realizando obras úteis, praticando ações de amor ao próximo, o que demonstra, fortemente, que sempre há uma alternativa, sempre há uma possibilidade de fazermos escolhas diferentes daquelas que a vida nos conduziu.

 

Essa reflexão nos conduz a perceber toda a real complexidade que envolve a palavra liberdade. E a necessidade é um componente de peso na questão da liberdade, pois a impossibilidade de atender às minhas necessidades pode me escravizar. Uma pessoa que esteja sofrendo de uma dor lancinante, por exemplo, será escrava dessa dor que a atormenta, até que lhe seja atendida a sua necessidade de alívio.

 

O mesmo exemplo pode ser estendido a doenças, sejam elas físicas ou psiquiátricas. A doença nos limita ou nos incapacita momentaneamente de realizarmos aquilo que gostaríamos de fazer, como um lazer ou um trabalho, por exemplo. Já a doença psiquiátrica é uma forma de limitação da minha liberdade bem mais profunda, pois afeta a minha liberdade de consciência, de pensamento, que é, como já dissemos, a dimensão onde teríamos a mais ampla liberdade.

 

Nem toda necessidade que acreditamos ter é, de fato, uma necessidade. Há necessidades que são criadas de modo artificial, forjadas pela sociedade. Um exemplo disso são as falsas necessidades estabelecidas pelo consumismo. A necessidade de escoamento da produção cria um bombardeio de propagandas sobre o que precisamos para sermos felizes, como se fossem necessidades.

 

A roupa nova de marca, o carro esportivo de luxo, a casa dos sonhos, as viagens para lazer a todo momento são necessidades criadas pelo meio social. Não são necessidades reais. Temos, sim, necessidade de nos vestirmos, de nos locomovermos, de realizarmos atividades de lazer, prazerosas, necessidade de abrigo, porém o consumismo nos leva a crer que temos mais necessidades do que as que realmente temos.

 

Essas falsas necessidades geradas pelo consumismo nos levam a uma escravidão mental maior, tornando-nos seres desejantes e insatisfeitos o tempo todo. Uma vez satisfeito o desejo, tido por necessidade, desejamos outra coisa, e depois outra. Isto é da natureza humana. O consumismo é só o reflexo dessa nossa condição humana, mas que é potencializada pela estrutura social da vida moderna, que criou indústrias, empregos, produtos, e precisa que seus produtos sejam consumidos, para que se gerem mais indústrias, empregos, produtos, num ciclo interminável.

 

O resultado disso é que vivemos aprisionados às falsas necessidades criadas pelo consumismo, sendo necessário nossa consciência avaliar, a cada dia, o que é, de fato, necessário e o que é apenas desejo sem controle, sem disciplina, sem limites.

 

FORÇA COERCITIVA DO MEIO.

 

São muitas as influências que o meio nos impõe, seja o meio físico ou o meio social. Recebemos influências da educação, do afeto ou a falta dele que recebemos de nossos pais; somos influenciados pela cultura de nosso país, pelo clima, pelos costumes sociais vigentes, pelas leis do país que habitamos; sofremos influência das pessoas com as quais interagimos durante nossa vida, e essas interações podem ter sido abusivas, violentas, traumáticas, ou positivas, estimulantes, benéficas.

 

Somos influenciados pelas estações do ano, pelos dias de Sol e pelos dias de chuva. Mas como essa influência é percebida por cada pessoa varia muito. Há quem fique deprimido nos dias sem Sol e no inverno, mas há quem se sinta confortável em momentos assim.

 

Assim como o Astro-Rei nos influencia, também somos influenciados, de modo mais sutil, pelos ciclos lunares. E se somos influenciados pelo Sol e pela Lua, não há nada de absurdo na ideia de que somos influenciados pelos demais planetas e estrelas.

 

Mas essas influências não determinam o que nós somos; apenas definem as condições em que nos situamos e nos desenvolvemos. Se uma planta nasce num terreno pedregoso, árido, rochoso, terá condições mais adversas para se desenvolver. Com um pouco de cuidado, adubagem e tecnologia, é possível enfrentar essas adversidades.

 

Da mesma forma, se sofremos as piores influências possíveis do meio, ainda assim podemos nos desenvolver, embora o esforço interior de nos sobrepormos às adversidades seja grande. Como dizia o filósofo Jean-Paul Sartre: “Não importa o que a vida fez de você, mas o que você faz com o que a vida fez de você”.

 

Sejam quais forem as forças que cerceiam nossa liberdade, sempre dispomos da liberdade de escolher como queremos agir, sempre temos a possibilidade de pensarmos diferente e tomar o rumo para nossas vidas que a nossa consciência nos fala.


INFLUÊNCIA DO ORGANISMO

 

Do mesmo modo, nosso organismo, nossa genética nos influencia. Para o materialista, aquele que não enxerga no ser humano senão um conjunto de células e órgãos, nós seríamos o produto da nossa genética. Nosso pensamento seria produto do nosso cérebro, assim como o suco gástrico é um produto do nosso estômago.

 

Para o materialista, o livre-arbítrio seria uma ilusão, já que o nosso pensamento, nossa vontade, nossos pendores, habilidades, nossas tendências seriam apenas produto do cérebro. Mas quem pode afirmar ou negar, com certeza, que nosso cérebro não seria apenas um órgão pelo qual se manifesta nossa alma?

 

Existem inúmeros relatos de pessoas consideradas mortas, ou em estado de coma, que se veem flutuando sobre o corpo, têm experiências fora do corpo, pensam, sentem alegria, paz, felicidade, visitam lugares considerados paradisíacos, conversam com familiares que já morreram, tudo isso num estado em que o cérebro não poderia estar em atividade. Isto é um indício de que o cérebro, assim como os demais órgãos físicos, apenas permite a manifestação desse ser que está momentaneamente imerso na matéria.

 

O corpo físico é como um instrumento musical. O musicista – no caso, a alma da pessoa – pode ser talentoso e grande instrumentista, mas se o instrumento está desafinado ou defeituoso, não poderá resultar disso uma bela música. Se o musicista não é um bom músico e o instrumento for da mais alta qualidade, ainda assim a música produzida não será boa. Porém, se o músico for bom e o instrumento também, a música produzida será de ótima qualidade. A música, nessa metáfora, seria a forma como a pessoa vive, suas ações, suas decisões, como exerce sua liberdade no mundo.

 

O instrumento, por si só, não faz uma boa música, mas pode limitar a ação do músico – no caso, a alma. Isso mostra que o corpo exerce enorme influência sobre a alma, mas a alma não é produto do corpo. O corpo pode limitar a manifestação da alma, estabelecendo freios, limites, ou pode permitir a sua mais livre manifestação. Porém, o corpo é apenas o veículo de manifestação da alma, sendo mais ou menos maleável a manifestação dessa essência que pensa, sente e tem livre arbítrio.

 

ENFIM, LIVRE.

 

Creio que a liberdade plena somente pode ser imaginada e compreendida quando, num exercício de pensamento, pudermos imaginar o ser humano liberto da matéria, das suas necessidades, assim como liberto das paixões que o escravizam. Se a alma é um ente independente da matéria, não há nada de absurdo imaginar que ela sobrevive à morte do corpo e continua sua jornada.

 

E nessa jornada de progressão infinita, de exercício incessante da liberdade, com a constante colheita das consequências das escolhas que faz, a alma vai aprendendo e se aperfeiçoando cada vez mais, vivendo em diversos corpos materiais, em diversas experiências carnais que lhe permitam o desenvolvimento de sua consciência.

 

Nessa caminhada de aprendizado sem fim, chegará um momento em que a consciência da alma será tão afinada com as leis da vida, que ela sequer irá desejar o que não deve ou o que não é bom para ela. Será então quando o Ser fará somente o que deve, porque quer. Sua única necessidade será o bem, compreendido em toda a sua plenitude. Mas, longe de ser uma necessidade escravizante, imagino que o bem supremo, sentido, praticado e escolhido, seja a libertação definitiva de nosso ser.