quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Carta à Natureza

Poema de: Alexandre Paredes

 


Perdão, Mãe Natureza! Perdão!

A ti pedimos perdão pela nossa insanidade

Porque a ti queimamos sem nenhuma piedade

E enquanto a Terra arde, frio está nosso coração

 

Morrem a Amazônia, o Cerrado, a Mata Atlântica e o Pantanal

E apesar de heróis-bombeiros lutarem em meio a tanto caos

Alguns se articulam para poder fazer “passar a boiada”

Já outros assistem, indiferentes, à vida ser exterminada

 

Assustados e sedentos, animais batem em retirada

E quando retornam não encontram quase nada

Daquilo que um dia, outrora, foi seu verde abrigo

Perambulam pelo antigo lar, desorientados e famintos

 

Ainda ouvimos o grito da quase extinta Mariana

Que foi sufocado pelos rejeitos de um mar de lama

De uma barragem que se rompeu e tanta dor nos trouxe

E assim destruiu um rio que um dia já foi Doce

 

Mas esse desastre ambiental não foi suficiente

Foi preciso perder mais vidas humanas, mais gente

Agora o lamento dos peixes e pescadores não está sozinho

Pois, com eles, choram também as famílias de Brumadinho

 

Mãe Natureza, você é assim destruída em nome de que?

São tantos discursos, mas qual a versão verdadeira?

Será que é preciso sofrer mais para podermos aprender?

Não dá mais para continuar a tapar o Sol com a peneira

 

Quem acredita nessa estória quase infantil

De que tamanha queimada como nunca antes se viu

Começa com o índio e o caboclo que põem fogo na roça?

O homem sensato e informado dessa piada faz troça

 

Alguns discursos são apenas cortinas de fumaça

Para desviar da multidão o foco de sua atenção

De modo que não veja o perigo que a todos ameaça

O do empobrecimento do solo e sua desertificação

 

O perigo do fim das nossas bacias hidrográficas

Que levam água ao homem do campo e da cidade

Sustentam a agricultura, a pecuária e a biodiversidade

Mas não se recuperam perante mudanças tão drásticas

 

O público incauto acredita na mentira e na oratória

Que não conseguem ocultar a atividade predatória

Pois se ouvirmos bem os discursos, passarmos a limpo

A intenção é transformar algumas reservas em garimpo

 

Sob o pretexto de desenvolver a economia

A verdade é que apenas um pequeno grupo se beneficia

Da transformação das nossas florestas também em pasto

E esse benefício será somente o de um lucro imediato

 

Pois a médio e longo prazo, nunca é bom negócio

Reduzir a nossa terra somente ao agronegócio

Reduzir nossa visão a um estreito projeto de poder

De quem se apóia num grupo para poder se reeleger

 

Nossos governantes fazem hoje vista grossa

E pelos bastidores, sabotam a fiscalização

Em nome de um falso progresso, promovem a destruição

Enquanto grande parte da população apenas endossa

 

Muitos são assim coautores, cúmplices de um crime

Omitem-se perante a devastação que oprime

O direito das gerações futuras, que terão por herança

Um mundo com menos vida e uma vida com menos esperança

 

Mas sei – oh, Natureza! – que você cobrará o seu preço

Não importa nossa preferência política ou ideologia

Tudo o que semeamos no mundo colheremos um dia

E se hoje desprezo a vida, é porque então não a mereço

terça-feira, 15 de setembro de 2020

Discursos de Ódio

Artigo de: Alexandre Paredes









Discursos de ódio começam de forma imperceptível, por meio de uma piada, uma ironia, uma palavra ou expressão originada do preconceito, um apelido que visa a ressaltar alguma característica do outro que nos incomoda.

Mas por que determinadas características do outro nos incomodam a ponto de gerar em nós a necessidade de uma expressão que agride? Geralmente, a piada em forma de agressão verbal ou o termo pejorativo dirigido a alguém nasce do desejo, mesmo que inconsciente, de diminuir o outro, por esta ou aquela característica que o deprecie, pela simples razão de que, se eu não consigo me valorizar pelas qualidades que possuo, preciso diminuir o outro para me sobressair.

Ocorre, também, quando nos sentimos ameaçados em nossa posição no mundo, em nossa visão de mundo, ameaçados pelo diferente, ou porque temos o desejo oculto de possuir algo daquele que é o objeto de nossa agressão.

Chamar o outro de “burguesinha” ou “burguês”, “patricinha” ou “mauricinho”, por exemplo, é uma forma agressiva de adjetivar o outro. Pode ser que se esteja querendo chamar a outra pessoa de frívola ou que ela seja uma pessoa que só está acostumada a uma vida fácil, sem esforço, e isto significa que, se eu denomino o outro dessa forma, é porque não tenho essa falha de caráter, ou, pelo menos, acredito que não. Alguns estudiosos da Psicologia dirão que o que eu critico no outro é aquilo que há em mim de forma reprimida. É o que eu, intimamente, gostaria de ser, mas não posso ser, ou não me foi permitido ser, ou que eu não me permito ser.

Esse exemplo de crítica revela que pode haver um ressentimento pelo que o outro tem e eu não tenho, um ranço pela riqueza que o outro tem ou conquistou e que, ocultamente, eu desejaria ter também. Bastaria ao anti-burguês sair da sua condição menos favorável para uma situação mais privilegiada para vermos seu discurso anterior desaparecer.

Por outro lado, historicamente, o burguês foi uma classe que incomodou os aristocratas, os nobres, donos de terras, que, durante séculos, foram os donos do poder e dos privilégios da sociedade. De repente, o mundo estava mudando, e o valor não estava mais totalmente centralizado na posse de terras, mas, também, na riqueza adquirida pelo comércio. Surgia, então, a classe burguesa, que se enriquecia à base do acúmulo de capital e ameaçava o status quo então vigente.

Se a classe burguesa incomodava o nobre, o mesmo se dava com relação ao clero, que se beneficiada da riqueza que vinha dos senhores de terras, coroava reis, centralizava toda a produção cultural, artística, intelectual durante a Idade Média. No Renascentismo, os burgueses também passam a financiar as produções artísticas e intelectuais, tornando-se uma concorrência ao poder e prestígio da Igreja.

Mas, sobretudo, o clero e os nobres se beneficiavam de uma visão de mundo então vigente na época, uma visão estanque, que dizia que Deus criou tudo assim como é desde o princípio, e era essa a vontade de Deus: que o escravo nasceu para ser escravo e deveria permanecer escravo, que criou o nobre para ser nobre, e os reis tinham essa condição previamente destinada por Deus.

Como se pode perceber, mudar essa estrutura do mundo era uma ameaça a uma visão de mundo que beneficiava determinados grupos de pessoas, de poucas pessoas, mas poderosas. Por isso, a Igreja, enquanto enriquecia, condenava o enriquecimento, por considerar ser ele decorrente do pecado da usura, porque, no fundo, não lhe era conveniente a mudança na estratificação social, nem uma mudança na visão de mundo.

A condenação da usura até podia ser legítima do ponto de vista moral, mas era só um subterfúgio, um pretexto, que escondia as verdadeiras razões dessa condenação: a ameaça ao poder da Igreja, pois, de acordo com a visão criacionista do mundo, tudo foi criado desde o princípio como é, porque sempre foi assim e sempre será assim, porque essa era a vontade de Deus.

Assim, uma simples crítica ao modo de vida burguês traz consigo toda uma história de discursos de ódio, que vão sendo reproduzidos por gerações, sem que nos apercebamos que apenas estamos reproduzindo discursos, ou que simplesmente temos inveja da situação social de outra pessoa, que nos incomoda porque, no fundo, gostaríamos de gozar da mesma situação.

O termo “vilão”, usado atualmente para designar aquele personagem vil, maldoso de qualquer estória de ficção, significa apenas “aquele que morava numa vila”. Na época dos senhores feudais, os vilões eram aqueles que tinham um menor grau de servidão perante o feudo e se aproximavam dos nobres, obtendo deles alguns privilégios. Por isso, deveriam ser invejados pelos demais servos, que viviam em estado de semi-escravidão.

É possível, também, que essa designação pejorativa para o vilão tenha se intensificado com o passar dos séculos, na medida em que as classes mais privilegiadas de outros tempos, os burgueses e os proprietários de terras, se sentissem ameaçados pelos vilões, ou moradores das vilas, ou a “plebe rude”, classe que, provavelmente, era assim chamada para que aqueles que usavam essa expressão pudessem destacar em si a nobreza de sua classe social, seu sangue azul ou sua riqueza que os diferenciava dos demais. Ou seja, aquela velha necessidade de diminuir o outro para que eu possa brilhar.

No mundo moderno, encontramos várias expressões que denotam esse ódio oculto, que transborda em forma de brincadeiras inocentes. A expressão “loira burra” é uma delas. Deve ter nascido do ressentimento daquelas que se sentiam ofendidas pela beleza de uma bela mulher loira, mas também oprimidas por uma visão de beleza eurocentrista, isto é, calcada na dominação cultural europeia, que humilhava aquelas que não se enquadrassem nesse padrão. Então, para ofuscar aquela que acredito ser mais bela ou para me vingar da dominação cultural do modelo de beleza imposto pela cultura dominante, foi preciso achar um defeito que a tornasse motivo de depreciação, para consolar e compensar a falta de beleza que eu acredito possuir. “Pelo menos, sou inteligente”, diriam.

Essa expressão pode ter nascido também do desejo oculto daqueles homens que gostariam de enamorar mulheres com esse perfil, mas acreditavam não estar à altura de tais desejos. Então, coloca-se um defeito no objeto de desejo. Assim como, na fábula da raposa e as uvas, a raposa desdenha do objeto de seu desejo, as uvas, quando não consegue alcançá-las: “estavam verdes”, diz a raposa.

Uma forma de ódio camuflado é ensinada às crianças desde pequenas quando se deparam com um menino efeminado. Mas em que aspecto uma pessoa com orientação sexual diferente da minha poderia ser tão ameaçador a ponto de criarmos tantas piadas que depreciam homossexuais e tantos nomes pejorativos para os diminuírem? É porque a simples existência do homossexual ameaça uma visão de mundo, de muitas pessoas, que diz que tudo o que está escrito na Bíblia (ou em qualquer outro livro sagrado, a depender da cultura de um povo) é a palavra de Deus.

Ora, se está escrito em algum lugar do Velho ou Novo Testamento qualquer trecho de algum personagem condenando práticas homossexuais, isto é para algumas pessoas o mesmo que Deus condenar a homossexualidade, apesar de a Bíblia ter sido escrita por seres humanos, falíveis, imersos numa determinada cultura, de uma determinada época. Nada mais triste do que o ódio praticado contra homossexuais, que são levados a acreditar que sequer podem buscar a misericórdia divina, já que Deus os condenaria, segundo os interpretadores da Bíblia.

Admitir que a homossexualidade é um fenômeno natural entre os seres humanos, que não é uma doença nem um desvio moral, seria admitir que há coisas escritas na Bíblia que não correspondem à palavra de Deus, que foram escritas por pessoas que manifestaram seu pensamento, adequado a um momento histórico, a um contexto, e que nem sempre o que lá está escrito, e da forma como foi interpretado, é a expressão absoluta da verdade.

Para os que condenam os homossexuais, o mote é a defesa dos chamados “valores tradicionais“ e o que seria uma “família cristã”. Ocorre que não existe uma definição do que seriam os chamados valores tradicionais ou o que seria uma família cristã, senão aquelas definições estabelecidas por homens falíveis, interpretadores de textos sagrados, que se transformaram em dogmas pelas igrejas constituídas.

Ocorre, também, que, ao atacar um ser humano, por meio da agressão verbal ou física, ou por meio do desprezo ou a indiferença, o pretenso cristão fere a lei áurea do próprio Cristianismo, que é “não fazer ao outro o que não gostaria que lhe fosse feito” e o “amar ao próximo com a si mesmo”.  Além disso, o próprio Cristo, cujas palavras parecem ser, muitas vezes, voluntariamente ignoradas, afirma que “todo aquele que faz a vontade do meu Pai é minha mãe e são meus irmãos”, ou seja, o conceito de família apresentado por Jesus se alarga além dos horizontes acanhados do que seria uma família tradicional, na medida em que ele valoriza mais os laços de afeição e afinidade recíprocas do que os laços consanguíneos.

Dentro dessa perspectiva da lei áurea do Cristianismo, que é compartilhada pelas principais religiões do mundo, uma família não tradicional, feita por casais homoafetivos, pode ter muito mais amor e valores dentro do lar do que uma família tradicional, de pai, mãe e filhos, que se diga cristã e tradicional. E, na prática, o que as pessoas fazem entre quatro paredes não pode ameaçar o que ocorre dentro de outras milhares de quatro paredes. A homossexualidade não é uma doença e muito menos uma tendência contagiosa que possa ser transmitida a quem não tenha essa condição.

Então, não há razões lógicas para que pessoas heterossexuais se sintam ameaçadas, e aqueles que têm orientação sexual diferente destes não deveriam se sentir diminuídos, indignos, menos humanos ou errados apenas por serem diferentes, apenas por serem uma minoria. Nossa história está repleta de exemplos de minorias que foram perseguidas pela ignorância e o medo daqueles que faziam parte das maiorias. Foi assim com os canhotos, que, durante séculos, foram estigmatizados, demonizados e obrigados a escreverem com a mão direita. O mesmo se deu com relação aos albinos, que foram, e ainda são em algumas partes do mundo, perseguidos, estigmatizados, apenas por terem características genéticas recessivas.

No fundo, os discursos de ódio de pessoas homofóbicas, como tantos outros, nascem, além da ignorância e do medo, da não percepção de que suas convicções são apenas suas convicções; de que seus valores elegidos podem não ser os mesmos na escala de valores do outro; de que seu sistema de crenças pode não ser compartilhado por uma multidão de outras pessoas. Nasce da não aceitação do diferente de si mesmo, e da imensa identificação com as próprias ideias, como se fossem a verdade absoluta.

Quando Copérnico e Galileu afirmaram que não era a Terra o centro do Universo e que os planetas, inclusive o nosso, é que giram em torno do Sol, por que essa verdade foi tão combatida e causou tanto ódio a ponto de levar Galileu à prisão domiciliar pela Santa Inquisição? Pelo simples motivo de que essa verdade vinha fazer cair por terra a ideia pregada pela Igreja, de que suas verdades eram prescritas por Deus e, por isso mesmo, eram infalíveis. A partir do momento em que a Igreja e seus interpretadores de textos sagrados admitissem sua falibilidade, todo o edifício dos dogmas ficaria comprometido.

Talvez seja por esse motivo que vemos, em nossos dias, com todo o conhecimento científico já conquistado pela nossa sociedade, pessoas defendendo a teoria de que a Terra seja plana, e não esférica como já comprovado pela Ciência, pelos navegadores e pelas imagens de satélites. Quando minha visão de mundo fica comprometida pelas evidências, uma estratégia da minha mente para não ceder à total desestruturação do meu sistema crenças é a negação e o combate àqueles que se opõem ao meu paradigma, criando sistemas e malabarismos teóricos para poder manter de pé todo o edifício de minhas crenças.

Pois rever todo um sistema de crenças é um trabalho árduo, doloroso e, muitas vezes, humilhante, embora libertador. Então é mais fácil eu combater todos aqueles que se opõe a esse meu sistema e buscar ao meu redor pessoas que compartilhem e reforcem essa mesma visão de mundo, ainda que irracional, ainda que insustentável diante das evidências.

Na nossa era da informação, as redes sociais e mídias digitais tornaram mais fácil esse caminho. Todos falam, todos opinam, mas geralmente escutam somente aqueles que compartilham das mesmas ideias; dificilmente escutam aqueles que se posicionam de forma diferente. Quando escutam, ou quando leem os posts até o fim, é somente com o objetivo de buscar argumentos que se opõe aos argumentos daquele que acreditam ser o adversário, e também para obterem o aplauso da plateia por meio de likes.

Nesse ponto, fica claro que, mais do que defender pontos de vista, há uma necessidade do ser humano de defender o seu ego, ganhar curtidas, aplausos, visualizações, de ganhar notoriedade perante o mundo, e é justamente essa supervalorização do seu ego que alimenta o ódio; que torna mais difícil perceber o outro, o diferente de si; que alimenta, enfim, uma multidão de desentendimentos, porque não é a vitória da verdade que se procura, mas a vitória sobre o outro.

É por conta dessa dificuldade em rever sistemas de crenças, passados de geração a geração, que, ainda hoje, existem movimentos sociais para que as escolas ensinem a visão Criacionista da Bíblia (de que Deus tudo criou em seis dias e de que toda a humanidade teria surgido de Adão e Eva) em contraposição à Teoria da Evolução das Espécies, de Darwin, amplamente aceita pela comunidade científica, como se ambas estivessem no mesmo patamar de teorias científicas, o que não é o caso.

Há quem ainda defenda a interpretação ao pé da letra da Bíblia, mesmo que vá totalmente de encontro às evidências. Quando, por exemplo, a Ciência revela fósseis de animais que viveram há mais de duzentos milhões de anos em nosso planeta, a ideia de que a origem de tudo na Terra tenha ocorrido há apenas alguns milhares de anos, como era pregado pela Igreja há alguns séculos, cai por terra.

O Darwinismo foi uma grande mudança de paradigma e um duro golpe ao sistema de crenças daqueles que interpretavam a Bíblia de modo literal e daqueles que acreditavam na infalibilidade dos dogmas das suas igrejas. Isto gerou uma necessidade de revisão da forma de interpretar a Bíblia. Para muitos, gerou a descrença, apesar de não haver nenhuma contradição entre o fato de Deus ter criado tudo e a evolução das espécies. Nada mais lógico do que Deus ter criado tudo para evoluir e progredir sempre, em vez de tudo pronto e acabado. Para outros, o evolucionismo deveria ser combatido até o fim, gerando a base de muitos fundamentalismos religiosos e discursos de ódio que vemos em nosso tempo.

A visão de que Deus tudo criou de forma estanque e com uma finalidade inicial imutável se contrapõe frontalmente à ideia de mudanças constantes, de evolução, de progresso. Na visão da Igreja, toda a Criação de Deus observava uma hierarquia que não mudava: os anjos teriam sido criados anjos e para sempre serem anjos; os homens teriam sido criados com um papel previamente definido na Criação e com status privilegiado em relação aos seres dos demais reinos da natureza; enquanto os animais teriam sido criados para servir aos homens. Ou seja, nessa concepção de Criação, Deus não seria justo, pois teria criado seres privilegiados – os anjos – e seres eternamente condenados à inferioridade – os animais. A ideia de evolução, ao contrário, permite que os seres estejam sempre se aperfeiçoando e subindo degraus na escala da evolução.

Essa mesma hierarquia se refletia na vida social, na forma de castas ou estamentos: o rei, no alto da pirâmide, era, assim como Deus, a representação do poder absoluto; os nobres, assim como os anjos, foram criados para serem nobres e era da vontade de Deus que assim o fosse; os escravos haviam sido criados para servir aos homens; e o clero, que também era uma classe privilegiada, já tinha seu papel definido por Deus. Ora, a partir do momento em que se admite que tudo evolui, que os homens evoluíram dos primatas, isto implica que a ordem social também pode e deve evoluir, que os escravos e os operários não nasceram com essa condição devido à um desígnio prévio da divindade, nem que os donos de terras são nobres por um decreto divino.

Até hoje sentimos os efeitos dessa mudança de paradigma, daqueles que ainda se apegam à ideia de que tudo e todas as criaturas já têm um papel previamente definido pela Criação e se contrapõe às ideias chamadas progressistas. Esse apego à ideia de que tudo foi criado para ser como é ou como era tem também outro motivo: o de que a minha posição no mundo, minha zona de conforto, passa a ser ameaçada.

Um exemplo disso é o machismo. A ideia de que Deus criou Adão do barro e Eva a partir da costela de Adão parece ser bem conveniente ao machista. Esse mito da criação de Eva deve ter ignorado propositalmente que é a mulher quem carrega um ser em seu ventre durante nove meses e dá à luz um novo ser. Para o machista, a mulher foi feita para servir ao homem, sendo inferior a este. Isto lhe é conveniente para que ele possa continuar a agir como um déspota, não tenha sua superioridade questionada e continue a usar a mulher como um objeto para o atendimento de suas necessidades.

Quando as mulheres passam a ter voz na sociedade e empoderam-se, e não mais se submetem aos caprichos do homem, ele se sente ameaçado e inseguro, e quer voltar aos tempos em que tudo estava sob o seu domínio. Daí vem os discursos de retorno à família tradicional e de combate ferrenho a outros paradigmas de família que não se enquadrem no seu conceito de família, no qual tem o homem o papel de superioridade, enquanto a mulher, de submissão e subalternidade. Surgem os discursos de retorno ao passado, de que antigamente havia maior senso de moral, o que é uma tese que não se sustenta; basta olhar para o passado e ver o Holocausto, a bomba atômica, o genocídio de povos indígenas e a crucificação romana.

Na verdade, o machismo deve ser uma postura com raízes em nossos ancestrais primatas, quando a sociedade, ainda animalizada, era dominada pela força bruta. O mito da criação de Eva veio, provavelmente, somente para chancelar um costume já existente na sociedade e sempre tido como normal. Mas há interpretações sobre o mito de Eva que seriam mais favoráveis à exaltação do papel da mulher, pois se ela nasceu da costela de Adão, compartilha com ele o mesmo status de humanidade, o que já era um avanço para a mentalidade vigente à época das sociedades primitivas, quando prevalecia a lei do mais forte.

O ódio das classes menos favorecidas é o mais compreensível, mas também não é legítimo, se é que exista algum ódio legítimo. Aquele que vive em condição de maior dificuldade, que foi oprimido sua vida inteira, pela sociedade, pelo sistema, pela polícia, pela justiça, pelas leis injustas, acaba deixando-se levar pelo ódio aos privilegiados, aos governantes, aos agentes do Estado, de forma indiscriminada. Acaba por odiar, inclusive, aqueles que, embora tenham nascido em condições melhores, com mais oportunidades, foram trabalhadores, justos, criaram empregos e podem ter feito bem a um sem-número de pessoas.

Mas o ódio não vê isso, porque ele é cego. Seu alvo é o outro, o diferente, aquele que faz parte do outro lado do sistema e, numa visão simplista, se não é oprimido, é opressor. Pois o ódio é como o fogo: um incêndio pode ser iniciado tendo por foco algo ou alguém, mas acaba se alastrando e afetando a todos e, na maioria das vezes, afetando pessoas inocentes, que não têm nenhuma relação com o objeto do ódio. No fim das contas, o ódio, assim como o fogo, acaba queimando, em algum momento, quem ateou o fogo primeiro.

Essa cegueira do ódio é bem exemplificada em algumas situações de nosso cotidiano. Não é raro vermos uma pessoa ser linchada porque a população revolta-se contra um crime e, logo em seguida, descobre-se que a pessoa linchada não era o criminoso. Mas, ainda que fosse linchada a pessoa certa, essa prática é totalmente bárbara e pré-histórica, não tendo nenhum respaldo no verdadeiro senso de justiça. A justiça autoriza a punição, a reparação de um dano, de forma proporcional ao crime cometido, mas não a satisfação do nosso ódio.

Em protestos contra determinadas injustiças, os revoltosos cometem injustiças tão infelizes quanto as primeiras: saqueiam lojas, queimam prédios, depredam o patrimônio público. Nesse momento, os revoltosos igualam-se ou colocam-se em condição inferior àqueles que são o objeto do seu ódio.

No Oriente Médio, crianças palestinas já nascem aprendendo a odiar judeus e crianças judias aprendem desde cedo a odiar palestinos. Não importa para quem odeia se aquele que está do outro lado do muro está trabalhando, por exemplo, para impedir que o conflito se perpetue, que seja um pai de família honrado, que luta pela paz, pela justiça social. Se o objeto do ódio é o palestino ou o judeu, não se faz nenhuma distinção, pois o ódio rotula o outro antes de ele ser conhecido pelo que é, e iguala ou nivela todos que estão sob esse mesmo rótulo.

Após os atentados de 11 de setembro de 2001, muitos cidadãos islâmicos que viviam nos Estados Unidos foram vítimas de violência verbal ou física, como se eles tivessem alguma relação com os terroristas que realizaram os atentados. Para efeito de comparação, seria algo como os judeus odiarem todos os cristãos do mundo em razão dos milhões de mortos no Holocausto, perpetrado pelos nazistas alemães, já que eles eram, em tese, cristãos.

Odiar o outro pelo seu rótulo é irracional e seria uma grande bobagem se não fosse algo tão sério, tão danoso. Para o que odeia, o rótulo vem antes da pessoa, do que ela é, de como ela é de fato, seu caráter, suas virtudes e suas ações. Então o ódio rotula o outro por vários nomes, dando mais importância à embalagem do que ao conteúdo, tenha essa embalagem o nome que for: nordestino, negro, branco, ateu, muçulmano, cristão, católico, evangélico, judeu, gay, feminista, conservador, liberal, progressista.

Não importa como é essa pessoa, quais são as suas ideias; ela já é odiada pelo rótulo com que foi designada e é, pretensamente, conhecida antes mesmo de se manifestar no mundo, como se cada um de nós fizesse parte de um pacote completo, um combo de ideias e comportamentos. É como se a partir da minha cor de pele, meu país de nascimento, minha classe social, orientação sexual, preferência política ou ideológica, eu fosse igualado a quaisquer outras pessoas que partilham da mesma embalagem.

De maneira geral, fazemos com o outro algo semelhante ao que os nazistas fizeram com os judeus, só que de maneira virtual. Os judeus foram obrigados a sair às ruas com uma marca que os designassem, que era o símbolo da estrela de Davi no braço, de modo que os demais pudessem saber previamente que aquele ser humano se tratava de um judeu. Depois esses judeus foram colocados em guetos, depois em campos de extermínio e câmaras de gás.

O que nós fazemos é designar as outras pessoas por um determinado rótulo, que nos permite a sua identificação prévia. Com essa identificação, nós já as avaliamos e já as julgamos, e as colocamos num gueto virtual. A partir desse momento, não ouvimos o que essa pessoa tem a nos dizer, pois ela é alguém que representa ideias que devem ser combatidas ou exterminadas. E, em vez de combatermos ideias ruins com ideias melhores, com argumentos racionais, combatemos com o ódio à pessoa, denegrindo sua imagem, sua biografia.

O fato é que existem pessoas com comportamento ético e não ético entre liberais e conservadores, entre pessoas de preferências políticas de direita e de esquerda; há pessoas de bem, sábias e virtuosas entre religiosos e ateus, assim como há hipócritas e criminosos em ambos; há pessoas educadas e gentis em quaisquer nações ou etnias, e o contrário também, pessoas grosseiras, mal-educadas e vis em qualquer parte do mundo e qualquer cor de pele. Porque não é a embalagem que faz o conteúdo.

Em tempos de redes sociais, o ódio ganhou contornos sofisticados. Agora, não é mais a simples fofoca, a calúnia ou a mentira, mas uma rede de fake news, articulada, organizada, sistematizada para conduzir cardumes de pessoas a determinadas ideias e direções. Essa sistematização de notícias falsas atende a interesses de determinados grupos, que odeiam e manipulam o ódio, ou apenas se beneficiam dele. Em nosso tempo, o ódio se manifesta na forma de uma guerra de informação, contra-informação e desinformação, não para engrandecimento de um debate, mas para a anulação dos adversários, de suas ideias, para que prevaleçam as minhas, para que prevaleça minha visão de mundo e meus interesses, quase sempre disfarçados de interesse público.

Não é possível falarmos de discursos de ódio sem falarmos de ódio. Quando pensamos nele, imaginamos, na maioria das vezes, aquele inimigo visceral, o criminoso que ceifou a vida de um ente querido, aquelas pessoas que disputam terras e matam umas às outras, aqueles familiares que sempre se digladiaram por disputas de egos, de dinheiro, bens ou de atenção. Esse é o ódio que conhecemos e que, para muitos de nós, parece-nos distante, parece pertencer ao outro, pois odiar não é uma virtude nem algo muito bonito; não é um sentimento que gostaríamos de admitir.

Mas, se nem sempre temos facilidade de admitir que nutrimos esses grandes ódios, chamo a atenção para esses pequenos ódios, que nascem como uma faísca, uma fagulha, um palito de fósforo. E nenhum de nós está totalmente isento de ser essa fagulha ou de ser a palha que, de algum modo, propaga esse pequeno fogo e que acaba se alastrando e tomando proporções de incêndio.

Quando olhamos para o mundo que nos cerca, quantas vezes podemos dizer que não nos enquadramos e não embarcamos em determinados discursos de ódio, em piadas de mau gosto, em comentários sem reflexão sobre outras pessoas, em análises superficiais sobre nações, povos, políticos, grupos, religiosos e religiões? Quantas vezes não somos nós mesmos quem acendemos o fósforo ou a fagulha do ódio e contribuímos para o aumento da fogueira que existe no mundo?

De repente, o ódio bate à nossa porta, na forma de violência, mentira, maldade, calúnia ou desequilíbrios da parte de outras pessoas, e acreditamos que somos tão somente vítimas, mas cabe sempre perscrutar a nossa própria consciência para investigar até que ponto não somos coautores da permanente guerra em que nosso mundo está mergulhado.


quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Crenças Limitantes

Texto de: Alexandre Paredes

 

"Homem não chora", "Não relaxa", "Homens não prestam", "Não tenho tempo", "A felicidade não foi feita pra mim"; "A humanidade não tem jeito", " O bem é coisa rara", " No meu tempo era melhor", "O amor verdadeiro não existe".


Já pensou no poder das palavras? Elas refletem nossas crenças, muitas delas limitantes. Por que limitantes? Porque se eu acredito que não devo relaxar, eu não relaxo mesmo, nunca. Porque se eu creio que homens não choram, engulo minhas emoções e elas literalmente me engasgam ou me causam gastrite, ou se manifestam no meu corpo de algum modo. E, no fim das contas, não consigo chorar.


Se eu creio que a humanidade não tem jeito, não terá mesmo, até porque a humanidade começa por mim, e seu creio que a humanidade não tem jeito, então eu também não tenho jeito. E se eu acredito que não tenho jeito ou que ninguém tem jeito, não me esforço por me tornar uma pessoa melhor, nem me engajo para mudar a realidade ao meu redor.


Felizmente crenças podem ser mudadas, mas é necessário que identifiquemos as nossas crenças limitantes e nos perguntemos: "Será que essa minha crença é verdade mesmo? Ou é só uma crença fruto das minhas experiências mal-sucedidas ou daquilo que me ensinaram?"


Nossos traumas ou vivências negativas costumam retroalimentar nossas crenças negativas. Se uma pessoa não crê que possa ser feliz, ela sequer buscará os meios para encontrar a felicidade que procura. Como resultado, encontrará, cada vez mais, situações que a infelicitem, que, por sua vez, reforçarão a crença de que "A felicidade não foi feita para mim".


Como sair desse círculo vicioso? Primeiro, é necessário identificar, tomar consciência daquelas sentenças que proferimos que punem a nós mesmos, que nos limitam ou nos impedem de sermos o que somos, para que possamos mudá-las em nós.


Não se trata de sair por aí apenas repetindo frases positivas, como se fossem fórmulas mágicas que não precisassem ser sentidas ou interiorizadas. Mas se trata de um esforço de pensar e sentir a vida sob outro prisma, ou de um ponto de vista mais elevado, de ver a vida, as pessoas e a nós mesmos como se fôssemos um observador no alto de um monte, e perceber que, se abaixo de nós há tantas misérias, sofrimentos e dificuldades, acima de nós está o infinito.


Trata-se de compreendermos que os resultados negativos ou positivos que obtemos são decorrentes do que pensamos, cremos e sentimos; são resultado da nossa reclamação constante ou do nosso senso de gratidão perante a vida. São resultado do que emitimos, vibramos a cada momento.


Não se trata de colocar uma máscara da positividade, mas de retirar a máscara da negatividade que temos vestido e investido durante tanto tempo, e descobrir quem realmente somos e toda a luz que possuímos, para que possamos dizer a nós mesmos a cada dia que amanhece ou que passa: "Brilhe a vossa luz".

quarta-feira, 27 de maio de 2020

Quarentena

Poema de: Alexandre Paredes











Aprendi que tempo em casa não é tempo ocioso

Que distância não é a mesma coisa que indiferença

Que solidariedade também é um vírus contagioso

E aprendi a dar mais valor a uma simples presença

 

Aprendi que estar só não é o mesmo que solidão

E que estar ao lado de pessoas queridas é um privilégio

Que a doença é, por vezes, o nosso melhor remédio

Pois a tristeza às vezes vem para trazer mais união

 

Aprendi que amor nem sempre precisa de toque

E que cada um, mesmo distante, tem um toque especial

Que, mesmo por trás de máscaras, não somos assim tão fortes

E que, diante da mesma dor, até meu opositor é meu igual

 

Aprendi que a vida é feita de luta, mas também de pausa

Que não adianta querer ver o futuro, antecipar o final

Aprendi a ter certeza de que tudo na vida um dia passa

E a viver um dia de cada vez, pois a cada dia basta o seu mal

 

Enfim, não sei se aprendi tudo, mas de uma coisa eu sei

Que, depois tudo, será grande a alegria e mais forte o laço

Que mais valor terão os momentos que compartilhei

Que será mais simples a vida e bem mais apertado o abraço


sábado, 25 de abril de 2020

O que mais...

Texto de: Alexandre Paredes


O que mais assusta não é a velocidade do vírus, mas a virulência do ódio.

O que mais mata não é a doença em si, mas a indiferença de alguns governantes.

O que mais inquieta não é o avanço da pandemia, mas o avanço da ignorância, do negacionismo e das teorias da conspiração.

O que mais dói não são as aflições do contágio, mas ver a insensibilidade de alguns perante a aflição de tantos.

O que mais assombra não é o tamanho do desafio, mas perceber que não estamos unidos para enfrentá-lo.

O que mais consola não é saber que logo tudo voltará a ser como antes, mas, justamente, reconhecer que, depois de tudo isso, o mundo não será mais o mesmo.

O que mais encoraja não são as palavras de otimismo e de esperança de alguns, mas o trabalho silencioso de pessoas anônimas, que atuam na linha de frente: enfermeiros, médicos, coveiros, lixeiros, bombeiros e heróis da solidariedade.

O que mais dá esperança não são as promessas de vacina ou de cura, mas a certeza de que as aflições coletivas são grandes oportunidades de correção de rumos.

O que mais alegra não é somente ver os aplausos aos profissionais de saúde, as cantorias nas janelas e as “lives” nas redes sociais, mas observar que, apesar do isolamento e da distância social, a mesma dor em comum nos tem feito perceber que somos uma só humanidade.

O que mais fortalece nossa fé não é crer que o mal ou a morte não baterão à nossa porta, mas a convicção de que a morte não existe, de que nenhuma dor chega-nos por acaso e que toda provação é um instrumento para a nossa educação espiritual, a fim de que nos tornemos pessoas mais felizes perante a eternidade.

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Manual de um Ditador em 10 Passos


1) Banalize o ódio. Separe o povo entre o "nós" e os outros. O ódio é ótimo para fortalecer um sentimento de coesão de grupo; afinal os inimigos, o mal, são os outros. Fica mais fácil de visualizar e de combater.

2) Espalhe a ideia de que quem não pensa como você ou que o ameaça é inimigo do País.

3) Combata a imprensa livre, pois a única versão dos fatos que interessa é aquela que lhe convém.

4) Combata os demais poderes, ou os desacredite; afinal, eles são uma concorrência.

5) Crie uma legião de fanáticos, pois, diante da paixão cega, argumentos racionais são inúteis.

6) Use o patriotismo como pretexto pra tudo, até para destruir a democracia, até para usar de tortura, censura e violência; pois os "interesses da nação" são mais importantes.

7) Dissemine a ideia de que você é um Messias, um Salvador da Pátria. Isto fortalece a fé cega de seus seguidores.

8) Dissemine a mentira por meio de informações falsas, dúbias ou omissas, para reforçar somente aquelas informações que lhe sejam convenientes.

9) Use uma boa retórica. Diga que quem quer implantar a ditadura são os outros, os inimigos do País: você é uma vítima de uma conspiração (daqueles que são inimigos do País). Isto é ótimo para fortalecer a ideia de que a ditadura que você implantar vai ser para impedir a ditadura dos outros. Afinal, o bem somos "nós" e o mal são os "outros".

10) Não deixe que ninguém brilhe mais que você; afinal você é o Messias, você é o grande líder, e qualquer concorrência é inconveniente.

Artigo: Alexandre Paredes

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Live de Músicas



Esta foi uma live que realizei no dia 14/04/2020, pela FEBtv, programa Acordes Espíritas, quando apresentei algumas das canções que compus ao longo de mais de 30 anos música.


https://www.youtube.com/watch?v=66N58qPqhM4

sábado, 21 de março de 2020

Coronavírus - 10 Lições

Artigo: Alexandre Paredes


O novo Coronavírus, quando surgiu, parecia só mais um novo vírus que iria se restringir a um local ou não representaria uma ameaça assim tão grande. Afinal, o H1N1 foi mais alarde do que um grande perigo.
Mas, entre a perplexidade e o medo, constatamos, numa velocidade espantosa, que ele é um problema que afeta a cada um de nós e que o mundo, certamente, não será mais o mesmo depois dele.
Apesar de toda a dor e angústia em que a humanidade se viu mergulhada, podemos extrair algumas lições interessantes sobre essa pandemia que assola o nosso planeta:

1.   Em meio a um movimento antivacinas crescente neste século, nunca se desejou tanto como agora a descoberta de uma vacina que nos salve.

2.  Vivemos um momento em que muitas pessoas defendem teorias absurdas, medievais, que questionam algumas verdades científicas, como a esfericidade da Terra e a evolução das espécies. Porém, nunca precisamos tanto da Ciência como agora, para nos trazer alguma esperança de cura ou de tratamento; para nos dizer como devemos nos higienizar e nos proteger.

3.    Estamos rodeados de uma pandemia de teorias da conspiração, como a de que a ida do homem à Lua foi uma farsa ou a de que o novo Coronavírus teria sido uma criação da China para se beneficiar economicamente no cenário internacional. Porém, diante da realidade que bate à nossa porta, diante do colapso no sistema de saúde, do sofrimento da população e da recessão econômica mundial iminente, tais idéias não se sustentam. Percebemos que a realidade impõe-se por si mesma, por mais que queiramos negá-la.

4.   Num tempo de redes sociais e de tantas "fake news", em que se brinca com a informação e no qual a opinião pública é manipulada, em que se desdenha da ameaça por meio de falsas perspectivas, em que se atribui a veículos de imprensa a onda de “histeria” em torno do assunto, o Coronavírus chega de forma inquestionável e não deixa dúvidas quanto à gravidade de seus efeitos e à seriedade com que devemos nos portar perante ele. E, por ironia do destino, estamos todos atentos aos veículos de comunicação para obtermos as informações de que precisamos para podermos superar este momento. Nenhuma tentativa de falsear a verdade sobreviverá às aflições que chegam às nossas casas sem nos pedir licença, sem nos perguntar qual a nossa crença ou nossa opinião.

5.  O vírus se dissemina, sem discriminação, entre ricos e pobres, líderes políticos e pessoas anônimas; penetra, sem cerimônia, em países de primeiro ou de terceiro mundo; desconhece fronteiras, não faz distinção de credo, raça, orientação sexual, identidade ideológica ou partidária. Num mundo tão dividido e intolerante, seremos unidos pela mesma dor em comum e teremos de nos unir se quisermos vencer essa batalha que é de todos nós.

6.   Numa escalada recente de tensões entre Estados Unidos e Irã e diante de conflitos que se arrastam em outros países, todos foram ou serão abatidos por um adversário minúsculo, que nos mostra o quão frágil é a vida humana e nos aponta que nada pode ser mais importante do que a saúde e o bem estar dos povos, das pessoas, das nossas famílias e entes queridos.

7.   O homem de hoje não pode parar, a economia global não pode parar, o capital tem de continuar girando, e continuamos reproduzindo nossa forma de vida ignorando ou tapando os olhos para as consequências das ações do homem no planeta: o aquecimento global, a destruição dos habitats e a extinção de espécies em escala jamais vista. Porém agora o homem teve de parar. Pode ser uma parada necessária para pensarmos no que realmente importa, em quais são as nossas necessidades reais.

8.    Os únicos remédios que podem nos auxiliar neste momento são a prevenção, os cuidados de higiene e o isolamento social. Temos vivido, nos últimos tempos, tão ligados aos nossos celulares e tão conectados com o mundo, que nos esquecemos de estar presentes junto aos nossos entes queridos mais próximos. Porém, estes momentos de isolamento têm-nos levado a nos conectarmos mais com nossos familiares, e temos usado a tecnologia para nos conectarmos, de fato, como seres humanos.

9.   Quando o medo da morte, seja nossa ou de nossos entes mais queridos, agora se torna uma aflição inquietante e compartilhada por todos, nunca percebemos tanto como neste momento o valor daqueles a quem amamos e o valor de termos uma fé ou algum tipo de espiritualidade que nos ampare, nos console e nos eleve acima das inquietações do mundo.

10. Tivemos que nos afastar uns dos outros, para estarmos mais próximos; tivemos que não tocar, não abraçar, não beijar, trabalhar em casa, talvez para valorizarmos mais o contato, o olho no olho, a simples presença do outro, talvez para aprendermos a deixar nossas diferenças em quarentena, a fim de que possamos ser um só povo, uma só humanidade.


sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Palestra sobre Céu e Inferno

Esta foi uma palestra que fiz sobre Céu e Inferno, no Grupo da Fraternidade Espírita Irmão Estêvão, em 13/12/2019.

Nessa noite, choveu muito e ficamos sem luz. A palestra foi à luz de velas e sem microfone.

A reunião foi dirigida pelo companheiro Claudionor.

http://www.grupoirmaoestevao.org/sermons/ceu-e-inferno-alexandre-paredes/?fbclid=IwAR0UBevNOkXQDqmXmr70YW-kwl2NWArlNYmSlqmJU1fk0Xo3xw4f-urda3w



Palestra sobre Felicidade

Esta é a gravação de uma palestra que fiz sobre Felicidade, no Grupo da Fraternidade Espírita Irmão Estêvão, no dia 17/01/2020.

A reunião foi dirigida pelo companheiro Victor Hugo, voz que está no início do áudio.


http://www.grupoirmaoestevao.org/sermons/felicidade-alexandre-paredes/?fbclid=IwAR0yjT8gbWNNUbL0tJaBZx5czK6ShnLVJxDqHIhW7zJtu6B9TMdpRdnB7-4