Texto de: Alexandre Paredes
“Meu filho, para vencer na vida é preciso estudar”,
“se esforçar”, “para vencer na vida é preciso muito suor, muito sacrifício”, “para
vencer na vida, faça como eu fiz; veja como estou agora, veja o que consegui”.
Muitos de nós já devemos ter ouvido alguma fórmula
ou algum velho conselho sobre como “vencer na vida”, seja de nossos pais, avós,
seja da parte de pessoas que se veem como bem-sucedidas na nossa sociedade,
seja de oradores ou de escritores de livros de autoajuda. Mas o que significa,
exatamente, “vencer na vida”?
Numa visão simplista, aquele que venceu na vida seria
o que galgou os melhores postos na sociedade, que alcançou seus objetivos, que
atingiu um patamar de vida que tantos almejam, seja no âmbito material,
afetivo, seja no campo acadêmico, esportivo, a depender das aspirações que cada
um carrega consigo.
A primeira pergunta que devemos fazer é: A vida é
para ser vencida? O que ganhamos quando a vida é vencida? E quando não vencemos
na vida, somos o quê? Perdedores?
Boa parte de nós estabelece metas a cumprir,
desejos a satisfazer, sonhos a realizar. Muitas vezes, quando alcançamos
determinados objetivos, nós os substituímos imediatamente por outros, novas
metas, que estão sempre além.
E, assim, tendo sempre novos desejos a realizar,
mal saboreamos as pequenas realizações que conseguimos, porque, agora, a
vitória é aquela montanha lá na frente, e não mais aquele morrinho que ficou
para trás. Entre uma vitória e a próxima, somos apenas seres desejantes e
insatisfeitos.
Mas não é só isso. As realizações que conseguimos
nem sempre vêm acompanhadas de satisfação ou felicidade, porque os
acontecimentos exteriores nem sempre andam alinhados com o que acontece em
nosso mundo interior.
Michael Phelps, ex-nadador americano, maior
medalhista em Olimpíadas da história, revelou que, no auge da sua carreira, ele
quis se suicidar. Não queria mais estar no esporte, não queria mais estar vivo.
Passou por um processo de depressão grave. Hoje ele se dedica a causas
relacionadas à saúde mental.
Esse exemplo nos fala da complexidade do ser humano
e de como a vida que sonhamos nem sempre é a vida dos sonhos. Enquanto o mundo
aplaudia efusivamente os feitos fantásticos de um grande desportista, que
ganhava uma medalha após outra, batia novos recordes a cada nova final, subia,
enfim, nos pódios da vida, que talvez muitos de nós almejassem, sua vida
interior dizia outra coisa. Uma batalha interior, mais difícil, se travava
dentro dele mesmo, enquanto vencia exteriormente.
E muitos de nós, pessoas comuns, esquecemos de
estar presentes nos momentos mais simples da vida, porque acreditamos não
fazerem parte de grandes acontecimentos, grandes vitórias ou realizações.
Muitas vezes, vivemos momentos aparentemente sem grande importância, mas que
com o passar dos anos, são os que mais valorizamos: a refeição em família, os
primeiros passos do bebê, as flores desabrochando com suas cores e perfumes, os
momentos em que paramos para assistir um belo pôr do sol, as conversas com aquelas
pessoas que não estão mais conosco.
Porém, em meio a essas pequenas belezas da vida
comum, muitos de nós guardamos frustrações pelas vitórias não alcançadas, os
planos desfeitos, as dores de cada dia que cobram seu preço, os desejos não
realizados. E entre um desejo e outro, um plano frustrado e outro, em meio às
ambições que se sucedem, a vida acontece, com seu cortejo de alegrias, prazeres,
conquistas, e também de aflições que parecem nos atingir por um golpe do
destino.
É muito comum pessoas não muito bem-sucedidas,
frustradas, deleitarem-se com o declínio e os tropeços das pessoas famosas,
aquelas que, aos olhos do mundo, seriam vistas como as que “venceram na vida”.
Citemos o caso de Whitney Houston, famosa cantora americana que teve seu auge artístico
na década de 1990. A cantora viveu um casamento conturbado e problemas com
drogas.
Para muitos, o fracasso na vida pessoal de pessoas
famosas é quase um motivo de dissimulada satisfação, provavelmente porque
muitos se sentem fracassados perante a própria vida. E ver que uma pessoa de
sucesso tem uma vida pessoal conturbada deve trazer algum senso de conforto
para quem a critica. No caso da cantora da icônica canção “I Will Always Love
You”, lembro de muitos comentários maldosos, por parte de alguns, dizendo que o
problema dessas pessoas famosas que enveredam pelas drogas seria a “falta de
Deus”.
Quando alguém diz isso, no fundo ela quer dizer que
aquela pessoa famosa criticada tem tudo – dinheiro, fama, beleza, talento –,
mas falta-lhe aquilo que eu tenho: Deus. É uma forma dissimulada de dizer que,
em alguma medida, sou superior àquela pessoa vista pela sociedade como uma
vencedora, que agora se torna a vítima da minha fofoca. É somente um mecanismo
de fuga do nosso ego ferido. Meu comentário maldoso apenas revela a minha
própria dor.
Se o problema das aflições que assolam a saúde
mental de tantos famosos fosse mesmo a falta de Deus, não faria muito sentido o
padre e cantor Fábio de Mello sofrer de depressão e ansiedade. Não é só pelo
motivo de ele ser padre é que podemos dizer que ele tem Deus no coração. É
porque, de fato, toda a sua obra artística, sua sinceridade ao falar, a
sabedoria de suas palavras, sua humanidade em revelar publicamente suas
dificuldades emocionais, revelam a beleza de sua alma. E, mesmo assim, com toda
a bagagem que possui, também é alguém que luta, como todos nós, para encontrar
equilíbrio e saúde mental.
É alguém que, mesmo com toda a sua popularidade,
com todo o seu sucesso, não teve medo de se colocar no mesmo nível que qualquer
outro ser humano, que, mesmo diante do destaque perante o mundo exterior, tem
também, como todos nós, suas dificuldades interiores, invisíveis aos olhos do
mundo.
Certa vez, quando o médium Chico Xavier ainda era
uma criança, sua professora pediu para que os alunos escrevessem o que cada um
queria ser quando crescesse. Então, o Chico respondeu “Feliz”. A turma disse
que ele não havia entendido a pergunta. Provavelmente, imaginavam que a
resposta deveria ser algo a respeito da profissão que gostaria de exercer, se
gostaria de ser astronauta, jogador de futebol, médico, advogado, coisas desse
tipo. Mas o Chico respondeu à sua professora, com sua simplicidade de uma
criança de 5 anos, que “eles não haviam entendido a vida”.
Nada mais verdadeiro do que essa resposta de Chico
Xavier. Quando nos sentimos felizes, não sentimos necessidade de buscar
fórmulas para alcançar destaque, sucesso, fama, dinheiro, beleza, porque,
afinal, para que precisamos disso tudo? Para sermos felizes. E se nos sentimos
felizes, não precisamos de nada disso.
Quando nos sentimos felizes, não temos necessidade
de postar felicidade nas redes sociais, postar sucesso ou mostrar a aparência
de que vencemos na vida, de que vendemos sucesso ou de que estamos num
relacionamento romântico perfeito. Geralmente, aquilo que mais buscamos mostrar
para o mundo, sobre o que possuímos, conquistamos ou alcançamos, é ainda aquilo
que nos falta, ou não temos segurança sobre aquilo que mostramos estar em
nossas mãos, ou pode ser uma conquista que vem compensar algo mais profundo que
falta em nossa vida.
Não sei se é uma regra geral, mas quando o produto
está escasso é que mais ouvimos falar dele. Quando falamos demais sobre comida
é porque estamos com fome. Quando mais falamos sobre sexo, é porque ele não
está muito satisfatório em nossas vidas, ou não está sendo suficiente. Quando precisamos mostrar nas redes
sociais que temos uma vida de sucesso, é porque talvez não tenhamos tanta
convicção sobre isso. Ou é porque a obsessão pelo sucesso me faz esquecer de
carências mais graves que tenho em minha vida.
A vida mostrada nas redes sociais é uma vida
editada. Ela não mostra os momentos de dúvida, de dores silenciosas, os
momentos sem glamour, a rotina, a doença, o hospital, nem mostra as carências
que a pessoa sofre em outras áreas de sua vida para que aquela imagem de
sucesso pudesse acontecer. Então, sim, aquela pessoa pode estar, realmente,
vivendo um momento de vitória, mas a que preço? Pode ser o preço de um esforço
e de um trabalho edificante. E esse esforço é muito nobre; é aquele que faz a
vida valer a pena. Mas pode ser que aquele post
de vida bem-sucedida esconda muita dor e desencanto.
Uma vida efetivamente feliz dispensaria conteúdos
de influencers, dispensaria livros e
palestras de autoajuda, retiros espirituais, gurus, dispensaria ideologias
políticas e teorias filosóficas – aliás, que prejuízo para muitos seria se as
pessoas fossem felizes! –, porque ao estarmos felizes não precisaríamos buscar
nada, porque, afinal, tudo o que buscamos, seja a fama, o sucesso, o dinheiro,
a saúde, a vitória, nada mais são do que meios para atingirmos um fim, que
seria a felicidade. Ocorre que se continuamos buscando coisas, é porque ainda
não a encontramos.
Ainda é utópico falar de felicidade, pelo menos
aquela felicidade imperturbável. Nossa vida aqui neste mundo ainda é de total
impermanência. Num dia estamos felizes, ou vivemos momentos felizes, em outro
somos surpreendidos por um acontecimento triste ou aflitivo: um ente querido
que se foi, um transtorno financeiro, um acidente de carro, uma doença
inesperada, uma guerra que nos surpreende, uma bala perdida que nos atinge ou a
alguém que muito amamos.
A felicidade existe. Conseguimos senti-la,
lembrá-la, tocá-la, intui-la, mas ela escapa por entre nossos dedos. Tentamos
reviver aquele momento feliz, mas a repetição daquele mesmo momento feliz,
daquele momento na praia, do frio na barriga de um encontro apaixonado, do
sorriso de uma criança nos dando os bracinhos, não acontece outra vez. Pelo
menos, não do mesmo jeito. Cada momento é único e inédito, sempre. A gente pode
até viver outros momentos semelhantes e felizes, mas serão outros momentos.
Como a felicidade é um bem por demais complexo, acabamos
por nos atermos àquilo que nos parece mais tangível. Aliás, a felicidade não é
somente “um bem”, mas é “o bem” máximo. Quem busca a felicidade, não a procura
para conquistar alguma coisa. Não. Ela é o valor máximo, que se basta por si
mesmo, e não é um meio para conquistar um fim, mas é o fim para o qual todos os
meios que utilizamos convergem. Tudo o que fazemos, enfim, são apenas meios
para atingir um fim – a felicidade.
Na ausência ou na impermanência da felicidade,
buscamos, então, alguns valores menores, que se parecem com felicidade, soam
como felicidade, mas são tão somente a aparência de felicidade. Uma aparência
que, de vez em quando, chega a convencer até a nós mesmos sobre como, de fato,
estamos. E nos colocamos a pensar: “Tenho um bom emprego, uma bela família, um
bom salário, tenho saúde, filhos, mas...” nem sempre isso tudo significa que me
sinto feliz.
E dizer em voz alta que não me sinto feliz soa até
como uma blasfêmia. Muitos dirão, e até nossa própria formação moral e
religiosa dizem que eu deveria ser grato. Gratidão é uma palavra muito falada
no momento. E, de fato, ela tem um grande significado. Ela vem nos dizer que de
nada adianta vencer, conquistar, adquirir, se eu não tiver um senso de
percepção do que tenho ou consegui, se eu não desfrutar, saborear e celebrar
tudo que tenho. Sem gratidão, a gente vence e não percebe que venceu, a gente
vence e não celebra a vitória.
A gratidão é aguçar a nossa percepção sobre todas
as coisas boas que podemos desfrutar nesse momento. Mas não só isso. Há que se
ampliar essa percepção não só para as coisas boas, mas também, para todos
aqueles acontecimentos ou experiências amargas, os momentos difíceis, os fracassos,
os tropeços, que tanto nos ensinam e nos levam a buscarmos o melhor de nós. É
muito importante conseguir sentir gratidão também por todos os degraus que me
levaram até aqui e o que estão me levando para além do que sou hoje, e não
apenas pelas conquistas alcançadas.
Pessoas que tiveram uma biografia de sucesso nos
falam dos momentos em que duvidaram de si, dos erros, dos fracassos, que lhes
ensinaram mais do que os momentos de acertos e que foram eles que
proporcionaram chegar aonde chegaram. É muito famosa a forma como Thomas
Edison, o grande inventor e empreendedor norte-americano, inventor da lâmpada
elétrica, interpretava suas tentativas fracassadas de atingir seu objetivo de
realizar um grande invento: "Eu não falhei, apenas descobri 10.000
maneiras que não funcionam".
Ou seja, as nossas derrotas não são derrotas. São
apenas escolhas em que descobrimos que aquele caminho, aquela direção tomada
não foi boa. E se tomamos aquele caminho e aprendemos que ele não foi bom,
aprendemos alguma coisa. Aprendemos, pelo menos, um caminho que não devemos
mais seguir. E devemos ser gratos por isso também.
Mas ser grato por tudo não deve empanar a
honestidade emocional que devemos ter para com nós mesmos. Somente um olhar
sincero sobre o que me dói, o que me aflige, pode me fazer ter a percepção do
que eu preciso fazer para chegar a uma condição melhor. Enquanto eu estiver
somente repetindo o mantra “gratidão” em todas as ocasiões, mas não tiver
honestidade emocional para admitir as áreas da minha vida ou situações que me
infelicitam, que me afligem, não estarei contribuindo para mudar essas
situações. Enquanto eu não olhar para o espinho que está doendo e retirá-lo do
meu pé, ele continuará a doer.
Acredito que a vida seja mais sobre isso. É sobre
aprender. Aprender com as minhas dores, derrotas, lutas, lutos, mas também com
as minhas alegrias, vitórias, conquistas. É sobre aprender incessantemente,
progredir incessantemente. Não somos perfeitos. Ninguém é perfeito, mas somos
perfectíveis. Podemos ser melhores a cada dia. Não melhores do que ninguém, mas
melhores do que já fomos. Podemos amadurecer com as experiências, aprender com
elas, e usar essas experiências a nosso favor, a favor da nossa felicidade.
Mais do que vencer na vida, creio que estamos aqui
para vencer a nós mesmos – vencer nossos medos, nossas falsas necessidades,
nosso ego ferido, nossos ressentimentos, nosso egoísmo e orgulho. E quando falo
em vencer a nós mesmos, não penso exatamente numa batalha em que o homem adulto
oprime a criança ferida dentro de nós. Mas penso no adulto de hoje que dá a mão
à criança de ontem, que ainda vive hoje dentro de nós. Ou seja, vencer a nós
mesmos é nos curarmos. Porque a única pessoa que posso, de verdade, modificar
para melhor, ou curar, sou eu mesmo.
A gente até pode influenciar pessoas, inspirar
muitos a seguir caminhos melhores, ajudar outros tantos a se levantarem e a
terem uma vida mais feliz, mas o destino do outro dependerá das escolhas dele,
e também dos acontecimentos da vida que ninguém escolhe viver.
Porém, o que eu posso fazer por mim mesmo para me
tornar uma pessoa melhor só cabe a mim mesmo. E por que me tornar uma pessoa
melhor? Para ser feliz. Ainda que, perante o mundo, eu pareça uma pessoa
derrotada ou insignificante. Porque, na verdade, que importa o que eu pareço
ser perante o mundo? Jesus ensinou-nos, de forma, tão cristalina e profunda:
“De que adianta ganhar o mundo inteiro, mas perder a sua alma?” (Mateus 16:26).
Jesus de Nazaré, ao final de sua vida aqui na
matéria, foi preso, açoitado, humilhado, abandonado pela maioria dos apóstolos
no momento do suplício, crucificado. Poderíamos pensar nele como um exemplo de
pessoa não bem-sucedida ou um derrotado, segundo os padrões do pensamento
imediatista e materialista da vida moderna. Mas, ali na cruz, Jesus estava
vencendo, dando um ensinamento supremo de perdão, coragem moral, bondade,
misericórdia para com a humanidade, deixando-nos um legado imortal. Era a
vitória do amor silencioso sobre o ódio barulhento dos homens.
Logo em seguida, deu-nos uma demonstração da
vitória da vida sobre a morte, mostrando-nos que o nosso maior patrimônio é a
imortalidade da alma, que não perece com a morte do corpo físico. Isso muda
tudo. Quando o nosso ponto de vista está aprisionado sobre a pequenez da nossa
efêmera vida terrestre, tudo tem que acontecer aqui e agora. Tudo tem que ser
imediato. Daí o motivo de termos uma sociedade moderna tão imediatista,
consumista, materialista.
Temos que vencer na vida hoje, porque o amanhã...
bem, o amanhã talvez não exista. Esse é o pensamento de quem só enxerga a vida
dentro da perspectiva de que não existe uma vida futura, ou se existe, não tem
certeza. Então, toda a felicidade possível de ser alcançada, todo o sucesso
possível de ser alcançado, precisa acontecer nesses breves anos que vivemos
aqui na Terra.
Se considerarmos as pessoas que vivem em locais
onde a fome e a miséria destroem sonhos e futuros, as que vivem presas a um
leito de hospital, porque sofrem de alguma doença incurável, aquelas que
passaram por algum acidente que deixou sequelas irreversíveis, ou tantas outras
que vivenciaram situações inimagináveis de sofrimento, compreendemos que as
fórmulas de sucesso ou de como vencer na vida nem sempre se aplicam a todos.
Aquilo que funcionou para você pode não funcionar para outro, porque cada um
vive uma experiência única.
E se dissermos para essas pessoas que passam por
situações de sofrimento tão difíceis, que elas somente têm essa única
existência corporal para alcançarem toda a felicidade possível de ser vivida
por um ser humano, a perspectiva é bem sombria. A não ser que possamos falar de
uma felicidade que independe completamente de circunstâncias exteriores: a
felicidade da paz de consciência ou da alegria da superação dos maiores revezes
do destino e ser útil.
Neste caso, podemos citar Stephen Hawking, grande
físico e cosmólogo britânico, reconhecido por ser uma das mentes mais
brilhantes da contemporaneidade, que viveu grande parte de sua vida com uma
doença que o manteve preso a uma cadeira de rodas, com quase todos os músculos
do seu corpo paralisados. Conseguia comunicar-se com as pessoas por meio de uma
tecnologia que captava alguns movimentos da face. O que é mais inspirador em
sua história foi o fato de que, apesar de tamanhas dificuldades, ainda assim
conseguiu ser brilhante e fazer com que sua vida fosse útil para a humanidade,
não só pela sua contribuição à Ciência e ao pensamento, mas, principalmente,
por sua disposição em vencer obstáculos que, para muitos de nós, seriam
instransponíveis.
O mineiro Jerônimo Mendonça, que foi conhecido como
o “gigante deitado”, passou por uma doença que o deixou com o corpo imobilizado,
preso ao leito desde os seus 20 anos de idade. Mas isso não o impediu de
escrever livro e proferir palestras em todo o Brasil, consolando e levando
esperança às pessoas. É mais um exemplo de pessoa que venceu na vida, mas de
uma forma diferente da que estamos acostumados.
Na lápide do túmulo de Allan Kardec, o codificador
da Doutrina Espírita que viveu na França do século XIX, encontramos um belo
resumo do sentido da nossa existência: “Nascer, viver, morrer, renascer ainda,
e progredir sempre, tal é a lei”. Enquanto a visão materialista nos diz que
somos meras obras do acaso caminhando em direção ao nada inevitável, a ideia de
que estamos aqui neste mundo transitório para aprender algumas lições, realizar
algumas coisas e progredir, moral e intelectualmente, de forma infinita, é
bastante alentadora.
Essa perspectiva não tira de nós o desejo de sermos
felizes tanto quanto possível essa existência física nos permitir. Mas ela vem
nos dizer também que tudo bem se não está tudo bem. Sempre é tempo para
recomeçar, reconstruir e aprender alguma coisa com as lições da vida. Aprender para
sermos pessoas mais felizes. Esse é o único objetivo do progresso que
adquirimos ao longo de várias reencarnações sucessivas de aprimoramento da
nossa alma imortal.
Então, voltando às primeiras questões que fizemos
no início dessas reflexões: A vida é para ser vencida? Creio que sempre temos
coisas a vencer. São nossos desafios. Mas podemos perder e não será nenhuma
derrota definitiva, mas tão somente um novo impulso para seguirmos em frente e
sermos pessoas melhores. Se não vencemos hoje, recomecemos amanhã. Tentaremos
de novo e de novo. Mas a verdadeira vitória não é a vitória sobre o outro,
sobre o mundo, é a vitória sobre nós mesmos. Às vezes, aprender a perder pode
ser a nossa grande vitória. Uma vitória sobre nosso orgulho, por exemplo.
Gosto muito de uma frase de Jonh Lennon: "Tudo
vai acabar bem se não acabou bem é porque não foi o final”. Nessa perspectiva
de que somos almas imortais, momentaneamente vestindo um corpo, perecível, que
adoece, envelhece e morre, vencer na vida talvez seja compreender nosso papel
neste momento, qual a lição a ser aprendida, qual o degrau a ser superado, para
que possamos chegar ao próximo degrau, qual é, de fato, a vitória que preciso
alcançar.
Ainda vivemos uma vida imperfeita e longe de ser
plena, mas que é exatamente a vida de que necessitamos para nos tornarmos
pessoas melhores. Não estamos matriculados nesse curso chamado vida e nessa
escola chamada Terra apenas para curtirmos a paisagem ou para termos grandes
momentos de sucesso efêmero e passageiro.
Nossa grande luta, a grande vitória que precisamos
alcançar ainda é a vitória do homem novo sobre o homem velho, o “bom combate”,
lembrando Paulo de Tarso. Essa vitória dificilmente obterá os aplausos do
mundo, o reconhecimento da multidão, o retorno financeiro, a medalha no peito,
mas é para ela que aqui viemos. Todo o resto é ilusão.
Podemos alcançar a felicidade ainda neste mundo
material, repleto de impermanência, de altos e baixos, de desafios e lutas
constantes? Acredito que sim. Mas é mais uma felicidade interior, a felicidade
da paz de consciência, a felicidade do bem que se faz, das lágrimas que enxugamos,
dos sorrisos que plantamos, da paciência que inspiramos, do amor que fazemos
brotar, ou apenas do amor que doamos sem esperar nada em troca.
Creio que aquele que chegou a alcançar isso dentro
de si encontrou, sem sombra de dúvida, a maior das vitórias neste mundo.