Artigo: Alexandre Paredes
O justo e o
injusto, o ético e o não ético, o bem e o mal não pertencem nem à direita, nem
à esquerda, nem ao centro. São do ser humano. Então, encontramos pessoas boas,
educadas, gentis, solidárias, éticas, tanto na direita quanto na esquerda. E o
inverso também: encontramos pessoas ardilosas, violentas, truculentas,
demagogas, autoritárias, mentirosas, vis, tanto na esquerda quanto na direita.
Se o problema
reside no ser humano, então não existem sistemas políticos nem econômicos, nem
ideologias que, por si só, possam resolver os males da humanidade. Apesar dessa
constatação, é claro que alguns sistemas favorecem o que há de pior na
humanidade, especialmente os sistemas totalitários, enquanto outros apresentam freios
e contrapesos para que esse pior não se manifeste de forma mais danosa.
Mas não
haveria tirania numa sociedade ética, ainda que o sistema político adotado
favorecesse o despotismo, assim como não haveria ladrões mesmo que as portas
dos cofres dos bancos permanecessem abertas. Por outro lado, mesmo os sistemas
democráticos não são capazes de garantir que os interesses do povo sejam
atendidos, que não haja injustiça e que não haja supressão ou ataques às
liberdades, uma vez que por dentro dos sistemas vivem os seres humanos.
Os Estados Unidos,
por exemplo, sempre foram um modelo de democracia e sempre estamparam a
liberdade como valor máximo defendido por aquela sociedade. No entanto, no auge
da Guerra Fria, a maior economia do mundo, lutando para que o Comunismo não se
espalhasse pelo mundo e aumentasse o poder de influência Soviética, patrocinou
ditaduras, como, por exemplo, a ditadura de direita de Augusto Pinochet, no
Chile, em 1973.
O presidente
Salvador Allende, Socialista, havia sido eleito democraticamente pelo povo,
porém foi deposto por um golpe militar de direita, que iniciou a nefasta
ditadura de Augusto Pinochet, fantoche dos Estados Unidos. Então, a simples
palavra democracia não garante a existência de respeito aos direitos humanos, às
liberdades, nem de justiça social.
Sistemas
totalitários, tirânicos e violentos existiram tanto em ideologias de esquerda
quanto de direita. O Nazismo de Hitler, na Alemanha, e o Fascismo de Mussolini,
na Itália, foram ditaduras de extrema direita, enquanto o Socialismo da extinta
União Soviética foi um sistema totalitário de esquerda. No Brasil, a ditadura
militar de 1964 a 1985 foi de extrema direita, instituída, sob a justificativa
de alguns, para evitar o Comunismo, num mundo polarizado pela Guerra Fria, mas
não deixou de ser tão nefasta quanto qualquer outra ditadura no mundo.
Hitler e
Stalin se odiavam, mas, praticamente, se igualavam em crueldades e crimes
contra a humanidade. Assim, sistemas baseados em ideologias consideradas tão
opostas nivelaram-se pelo que elas tinham em comum: o desrespeito ao ser
humano, às liberdades individuais e de expressão. Aparentavam defender os
interesses da nação e mascaravam-se por trás do patriotismo ou da defesa de uma
causa maior, porém só camuflavam interesses escusos de seus líderes.
O Comunismo teorizado
por Karl Marx e Friedrich Engels nunca existiu além da teoria, e as
experiências de países com o Socialismo, que seria um degrau, uma fase para se
alcançar o Comunismo, afastaram-se das ideias originais teorizadas. O
Socialismo que se implantou na União Soviética distanciou-se em vários aspectos
das teorias originais de Karl Marx, da mesma forma que o Socialismo da China e
o da Coreia do Norte.
Ideologias são
sistemas de ideias, geradas pela cabeça de seres humanos, falíveis. Então, o
problema não está na ideologia, mas em querermos aceitá-las como verdades
absolutas e inquestionáveis. Em tudo, é possível reter o que é bom,
verdadeiro, e rejeitar o que não é. E isto se aplica a qualquer doutrina, seja,
por exemplo, o liberalismo econômico, o Comunismo, o Socialismo ou qualquer
outra.
A realidade
sempre se nos apresenta como uma coisa inédita. Então, sistemas de ideias de
pensadores de séculos atrás até podem ser boas em alguns aspectos, mas
provavelmente estarão defasadas com relação à situação atual, assim como
soluções aplicadas em sua vida no passado podem não mais ser aplicáveis ao
presente, da mesma forma que suas soluções podem não se aplicar à vida do
outro, pois cada vida é única, cada realidade é única.
Teorias,
doutrinas, são como ferramentas, cada uma adequada ao seu momento. Pode ser que
a marreta seja o melhor instrumento num determinado momento e, em outro, o
arado. Doutrinas que defendem o Estado Mínimo, por exemplo, podem ser boas
quando aplicadas a determinadas situações e momentos históricos, mas certamente
não se aplicam a um momento de pandemia, em que milhões de pessoas dependem da
ajuda direta do Estado para sobreviverem.
O problema é
que as pessoas abraçam determinados sistemas, teorias, doutrinas, ideologias, e
políticos sem pensamento crítico, com confiança cega. Casamentos terminam todos
os dias, apesar das juras de amor eterno feitas no altar. Promessas de respeito
e união são quebradas. Então por que colocar a mão no fogo por um líder, um
partido, uma ideologia, como o fazem tantas pessoas? Só a paixão pode explicar
isso. E a paixão distorce o bom senso e a razão.
Num sistema
democrático, o fato de votarmos em determinado candidato ou partido não significa
apoio incondicional a tudo o que ele faz ou fará; é um voto de confiança
apenas. Faz parte da democracia, também, a fiscalização das ações dos
representantes que indicamos para nos representarem, e não depositar neles uma
fé cega a tudo o que fazem ou que dizem.
Algumas
pessoas defendem que os seres humanos são produto dos sistemas em que estão
inseridos. Então, bastaria encontrar um sistema perfeito para que este molde as
pessoas de uma sociedade. Na verdade, sofremos grande influência do meio no
qual nos encontramos, mas sempre temos a escolha de pensar e agir de forma
diferente, de mudar, de transformar. Caso contrário, a humanidade estaria
sempre estagnada.
Nunca existiu
e nunca existirá um sistema ou uma ideologia perfeita, simplesmente porque os
seres humanos são imperfeitos. E o dia em que a humanidade se tornar uma
sociedade eticamente avançada, feita por seres humanos justos e sábios – e acredito
que isso acontecerá um dia –, os sistemas e ideologias serão desnecessários.
O caminho para
se chegar a essa sociedade só pode ser trilhado por cada um de nós,
individualmente, quando nos tornarmos para o mundo aquilo o que desejamos para
ele. Nada mais adequado a esse tema do que uma frase de Gandhi que
diz: “Seja você a transformação que você quer para o mundo”.